quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Suplicava Então

Suplicava então por um cobertor
Feito de céu e estrelas do mundo,
Era a única coisa a ter em redor
O último anseio de fulgor profundo,

Desconhecendo as pedras da calçada,
Do trilho que parece não ter fim,
Com todas estas lágrimas na alçada
Será que ainda há destino para mim?

A procura de oásis em palco de vida,
A água para saciar toda uma sede
Mesmo que seja noutra despedida,

Mesmo que só haja mais parede
Colocando sal em aberta ferida,
Abrindo a ferida, caindo na rede.

segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Palavras

Palavras doces, palavras tão belas
Para adornar o espaço no caminho
Que sejam parte do céu tal as estrelas
E como elas jamais te deixem sozinho,

Palavras tristes, palavras perdidas
Ornam o momento passado inaudito,
São a perdição das mentes iludidas
A morte dos loucos em tempo maldito,

Passa o tique vem o taque e nada muda
E o peso nos seus ombros não obstante,
Nem vem ninguém que lhe dê ajuda

Mas ainda há palavras para alumiar o dia,
Palavras para desejar palavras o bastante
Para considerar o instante como poesia.

Do Futuro

Do futuro de pouco me acho merecedor,
Nem de pão e água e um tecto a cobrir,
Vil destino de quem se dava por vencedor
Porém o medo então deixou de se diluir

No passo dado entre margens e cantos,
No instante que vale a pena viver,
Sobrando escombros de desencantos
Parecendo só faltar o saber morrer,

Sentindo a falta de ar onde ar não há
E o mundo desprendendo-se da palma
Pois há tão pouco para fazer por cá

Que se me desalenta e morre a calma,
Para quê reviver quem morto está
Nesta Babilónia que quebra a alma?

A Conta-Gotas

A conta-gotas caia então a perdida vida,
Desencontrada onde se devia encontrar,
Sim, tinha vindo o tempo de partida,
Estava na hora do avião enfim descolar,

Ele soluçava pelos sonhos quebrados,
Sendo cada fragmento a face dela,
Teria ele se juntado aos reis destronados
Não merecedor da mão de sua bela?

Não havia sono que trouxesse descanso,
Nem sorriso que não se desse por findado,
Era perda, dor e morte em triste remanso,

Tantos anos descartados à berma da estrada,
Que quase parecia que não tinham acabado
Na boca faminta que não saboreia nada.

domingo, 27 de dezembro de 2015

Do Tempo Quase Não Lembra

Do tempo quase não lembra tempo algum,
Só loucura redigida para o viandante,
Dos passos dados parece não haver nenhum
Que faça de seu destino o seu amante,

Esquecem-se as histórias de outros tempos,
Vai-se olhando com nevoeiro no olhar
Que é levado assim por outros ventos,
Ventos esses que não é possível amar,

Surge no trilho finalmente a indiferença,
Indiferente do trilho e seu percalço,
Logo nem dele é bem em pertença

É mais obstáculo caído em livre queda,
Percurso de pregos a pé descalço
Tortura, desgaste, a vil labareda.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Há Partes de Mim

Há partes de mim que em mim desconheço,
Cavalos correndo selvagens neste leito,
Vozes nunca ouvidas que não confesso
Batendo tão bravias sob este peito,

Algum simples sítio para afundar um seixo,
Esconder o desatino que me aprisiona,
Estas lajes que ao páramo lunar deixo
São para quem se sentar na poltrona

Permitindo o mundo entrar, consentir ser,
Sorrindo a lágrima que passa e não fica
Só então poderei de facto e enfim ver

O Homem que em si insiste porém abdica
Pois há partes em mim que só sabem correr
Na tapeçaria que nem sempre se versifica.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Estrelas, Quedas aos Cantos

Estrelas, quedas aos cantos do firmamento,
Palavras lançadas recontavam o instante
Em que Vida não era só lenda ao vento
Era deixai-me ir rodopiando adiante

Pelas sinuosidades deste eu labirinto
Por vezes agraciado por sua singeleza
Porém o que sinto não é bem o que sinto
Então por vezes não se encontra a beleza

Que é momento aqui revindo e eu amante
De quem vem por bem, de quem não sei
Pois já soube demasiado sobre semelhante

Prisioneiro sofredor, indiscutível fora-da-lei,
Tentando encontrar o que ainda é distante
Perdoem-me como um dia a alguém perdoei.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Até os Poetas Sabem

Até os poetas sabem quem é a morte,
Beijam-na por cada vez que há paixão,
Assim vão perdendo sua crença na sorte,
Passeando errante com dor no coração,

A saudade uma intenção, mais um pouco,
Estrada lunar é sua falta de uma vontade,
Uma lágrima, um desejo impar feito louco,
Dando passos ao longe pela tempestade,

Vão passando os dias sombreando o dia,
O sonho perdido – meu amor – desolador,
Estrelas cadentes tal escombros de poesia

Nem eu diria ou ousaria cantar sobre esta dor
Aos ouvidos transeuntes da rua em desvalia
Sobre esta balada lúgubre de quase amor.

domingo, 20 de dezembro de 2015

Ouvindo o Tiquetaque

Ouvindo o tiquetaque da hora passageira,
A vida meio fugidia torna-se ruido de fundo,
De todas as viagens um nada na algibeira
Parece pouco para apresentar ao mundo,

Tem-me em suas garras o taciturno Inverno,
Emaranhado nas teias do seu suave cabelo,
Ele é a ode em linhas dentro deste caderno
Uma sobre a outra tal e qual infindo novelo,

Cada fio é para mim outra razão para viver,
Suspiro aos céus o fado do outrora viandante,
Estes olhos enfim suplicam por algo acontecer

Pelo retornar da luz perdida só mais uma vez,
Pela chegada dos pássaros levando-me adiante,
Deuses da não Vida libertai o sonhador talvez!

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Desencantado Olhar

Desencantado olhar que ecoa na calçada,
A tristeza desta alma algures perdida,
Sozinhas as lajes são a pluma queimada
Enquanto o tempo em si é a dormida,

Procurava luz ao fim de infinda ladainha,
O homem morto por fim queria vida,
Andar direito era curva para meia linha,
Qual seria então a sua sina, a sua lida?

Em breve seria irmão para outros relentos,
Outro semblante vagueando o nocturno,
O poema olvidado deixado aos sete ventos,

Sim, um dia até minha sombra fugirá de mim
No passo solitário do vagabundo soturno,
Assim padece na terra o caído querubim.

domingo, 13 de dezembro de 2015

Soletro Estas Pegadas

Soletro estas pegadas soltas ao vento
Em silêncio cantado à madrugada,
Num mundo azul colorido a cinzento
Onde nem a alvorada é encontrada,

Perdido onde a estrada se dá por finda
No eterno acossar das curvas das ruas,
Por vezes esqueço o que a torna linda
Na solidão esculpida por mil e uma luas,

Saravá oh musas de todos os poetas,
Cantai-me sobre o trilho, cor e amor,
Guardar-vos-ei em mil e uma gavetas

Pertencentes a ninguém feito senhor,
Liberto-os sob mil e uma borboletas
Enfeitiçadas no perfume do beija-flor.

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Estes Olhos Soletravam

Estes olhos soletravam os passos da rua,
Lá fora ladravam os cães da vizinhança,
Silenciosamente esta solidão era da lua
Afagando seus dedos numa lembrança

Que hoje do esquecimento era pertença,
Era então ouvir meus cantos moribundos,
Como se a vida fosse a mais vil sentença
Neles vislumbrando meus mil vagabundos,

Quanto tempo já terá enfim sido passado,
Em si, ao longe, era os passos precedentes
Tal e qual última estrela num céu nublado

Alcançava a vista firmamentos aos molhos
Ainda cativo em pensamentos recorrentes,
Ao final, terá deixado cair o brilho dos olhos?

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Beijo a Chuva

Beijo a chuva e esperanço por um pouco de sol,
Assim passam eras e temporadas ao pé de mim,
Por vezes pergunto se fui presa para próprio anzol
E que género de vida é esta que se vai tendo assim

Quase sem viver, observando as folhas que caem,
Esperando neste quarto por alguns dias de verão,
À sua ausência, espero onde as estações se esvaem,
De braços semicerrados e com as mãos no coração,

Lembrando travesseiras e lençóis a azul repintados,
Rarefeito de mãos para partilhar quanto mais dar,
A repreensão ao mundo são estes olhos fechados,

Silentes e quietos não ousando ver quanto mais sonhar,
Só laivos de suspiros à moldura das fotos lançados
Logo se castiga o triste recluso de seu próprio andar.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Vem Vento

Vem vento e traz alguma paz e sossego,
Pensamento brando e pouco nevoento,
Um pouco de luz para o enfermo cego,
Silêncio para o murmúrio deste lamento,

Aqui onde apenas gritos em espiral há,
Vamos procurando nuvens para sonhar
Pois quando não chega a luzente manhã
Parece que nenhum destino há-de chegar,

Então é fugir e escapar dos fantasmas da alma,
Do escarcéu ruidoso impregne neste cantinho
Então algures encontrar paz, encontrar calma

Podendo assim contentar-me já maior, velhinho,
Esquecer a contenda que transparece na palma
E as rugas que se escondem no leito de pinho.

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Esperançando

Esperançando por esta pequena janela,
Pelo nascer do sol, pelo toque da flor,
Pois tenho todo o céu como aguarela
Para aqueles dias feios cheios de dor,

Deste rio de pouco tenho a certeza
Para além de que tudo é tão incerto
E nisso encontro toda esta tristeza
Que a morte um dia me terá coberto,

Por céus e mares fui errando sozinho,
Ninguém sabe quando há-de morrer,
Faço da falta de percurso o caminho,

As lágrimas e o sangue de uma vida,
Por tudo o que ganhar ou então perder
No fim será essa equação para a partida?

terça-feira, 17 de novembro de 2015

Passeia-se Mais Um Dia

Passeia-se mais um dia meio de repente,
O outrora viandante, inerte, fica na rua,
Ao relento de uma canção tão dormente
Que ele estranhava se esta ainda era sua,

As esquinas desdobravam-se ao luar,
Ele passava só onde a lua brilhava,
Quase incapaz de sentir seu passar,
Será que por lá ele ainda estava?

Ia sorrindo de soslaio à morte amiga,
Inculcava sua sombra aos lampiões,
Murmurando seu fado em cantiga,

Era a verdade de quem em si via o fim,
As estrelas se misturando com os aviões,
E enfim... ansiava o toque do querubim.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Só Uma Hora Mais

Só uma hora mais e o mundo acaba,
Aproveito para dizer o que não digo,
Só mais um pouco e tudo desaba,
É a última réstia de luzência que sigo

Por entre estas meias palavras e olhares,
Haverá rumo para o distante horizonte?
Sem destino basta de para mim bastares,
Procuro trajecto para o passar da ponte,

É o vil silêncio destes versos a sentença
Do homem procurando por si no Inverno,
O sentir falta de poiso, falta de pertença,

Não ter lugar ou sítio no mundo moderno,
Ficar nesta terra fustigada é meio doença
Até quando mais esta loucura, este inferno?

Hoje Debaixo do Sol

Hoje debaixo do sol um pouco de frio,
Sua ausência são os suspiros largados,
Ela nas minhas mãos é o espaço vazio,
É todas as porções que hei abandonado,

Aqueles bocados que hoje aqui não são,
Somos seres do céu aqui na hora errada,
Perdendo as asas, na estrada mero peão,
Deixado só ao despontar da madrugada,

Hoje debaixo do sol sou as lembranças,
Aqueles instantes em que fui inteiro,
O meio da selva, por estas andanças

Deixa um sabor agridoce nesta boca,
Esta minha saudade sob o aguaceiro,
Assim vêm barcos para a minha doca.

A Madrugada é a Terna Companhia

A madrugada é a terna companhia
Para quem vai às noites sem fim,
Sem dormir naquilo que parecia
Irmos nós passando meio assim

Quase em beleza, imortal percalço,
Resumindo toda uma existência
Do menino nu de pé descalço
E há quanto só sente sua ausência,

Correndo então contra as paredes,
Tropeçando na berma da estrada,
Não saciando suas mil e uma sedes,

Era sentir o mundo sobre sua alçada
Deixando seu peito cair em redes
E seu olhar turvo pela vil cilada.

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Sombras e Fantasmas

Sombras e fantasmas trazendo os dias
De mãos dadas com o que já não é,
Prisioneiro das ruas de fingidas euforias
Sem instante que traga um pouco de fé,

Assim nos esquecemos do já eclipsado,
Até a porção a que chamamos casa
Torna-se parte do já ido, do passado,
Partindo a vontade, quebrando a asa,

Já nem ouso esperar pela madrugada,
Se estes lábios já não tocam nos seus
Lá fora sou a chuva a cair na calçada

O passar do tempo é o secar do olhar
Nem me permite despedir, dizer adeus,
Quanto mais com a bonança esperançar…

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Trago

Trago só mais um resto de esperança,
A presença de um pouco de saudade
É o passar com um olhar de lembrança
Que é do viandante a sua cara-metade,

Trago só mais um bocadinho de vontade,
Só mais um pouco de querer ser e poder ir,
Para o trilho o já ido apenas meia verdade
De quem se dá ao choro tanto como ao rir,

Trago em mim décadas que aqui nunca foram
E píncaros e minúcias a quem já não importa,
Se foram instantes negros que ora douram

Não sei! Foi ponto de vista de quem passa
Nem sei se bateram de todo nesta porta,
Trago todos e nenhum ao passar na praça.

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Esta Nossa Noite

Esta nossa noite deambula pelo já ido,
Encontremo-nos algures pelo seu meio,
Procurai-me lá quando já tiver partido
Partindo sem algum travão nem freio,

Por mim seremos novamente um dia,
Haja sol ou chuva seremos novamente,
De vós já quase ouço a familiar melodia,
Somente há que caminhar em frente,

Será aquilo que em nós é maior que nós?
Inquiro às sombras que passam na calçada
Pois se for é preciso dar-lhe cor, dar-lhe voz

É preciso dar os passos para a caminhada,
Não mais me interessa a distância até vós
Desde que estejais lá minha doce, doce cilada!

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Desabrocha

Desabrocha a suavidade do porto de abrigo
E eu, sozinho ou contigo, lembro o passado,
Sim há vezes em que preciso de um amigo,
Há vezes em que o sol não se dá dourado,

Oferece-me o peito e deixa o tempo passar,
Cansam-me as correrias da sobrevivência,
Não tenho tempo para viver, para amar
E magoa-me da situação ter consciência,

Verte-se-me a tristeza de uma geração
Que não tem hipótese de ser ou viver
Que não tem quem lhe ofereça a mão

E lá vai indo direita por caminho torto,
Há vezes que a vida só deseja morrer
E que em vida é só o homem morto.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Tenho Tragado

Tenho tragado o som da madrugada,
Como se tivesse em mim repousado,
E à primeira claridade aqui albergada
Será que do dia havemos abdicado?

Um dia soltarei as amarras deste cais,
Partirei sem olhar para o que foi ontem,
Queimando as pontes pois sei que jamais
Terei lar onde quer que estes olhos apontem,

Faço da incerteza a única e bela certeza,
Do vento longínquo o beijo, os abraços,
Não sei se haverá dia, se haverá beleza

Porém estou desejoso de dar esses passos
Que levam ao desconhecido em franqueza
Deixando para trás meus mil e um pedaços.

terça-feira, 6 de outubro de 2015

O Tempo É Tão Curto

O tempo é tão curto nesta breve viagem,
Ficam ideias de rostos que vão passando,
Especando à vidraça tal de louco miragem
Cravam-se ao olhar por onde vou olhando,

Hoje há recôndita penumbra e seus luares
Relembram as vezes de um sorriso aberto
E desta minha passagem por tantos lugares
O trilho desta jornada parece sempre incerto,

Dos passos dados, lágrimas derramadas,
De que todos partiram deixando-me só
E desses fins, dessas fotografias rasgadas

Por vezes parece que o tempo não tem dó,
E se um dia for entre paredes tresloucadas
Esqueçam-me enfim entre estratos de pó.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Cubram-me de Penas

Cubram-me este corpo de penas
Pois nunca aprendi mesmo a voar,
E quando partir saibam só e apenas
Que só parto pois nunca soube ficar,

Cubram-me este meu olhar de estrelas
Pois preciso de luz para conseguir ver
E se algum dia me esquecer delas
Esse foi o dia em que comecei a morrer,

Cubram-me os lábios num enorme abraço
Que me aqueça a alma e vá relembrando
Que a vida não é só um enorme cansaço

Que há instantes por nós ainda ansiando
Enquanto vou pelo trilho, pelo espaço
E o mundo inteiro a si se vai mudando.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Descei Comigo

Descei comigo às sombras desta cidade,
Repouso onde este corpo se perecer,
Ainda não fui mas já sinto réstias de saudade,
Será esta a dor de quem não sabe viver?

Surge o relógio apontando a ampulheta,
O tiquetaque contínuo na vidraça
Quase lembra o quão a hora é incompleta
E preguiçosa ao não tempo se enlaça,

Pois então cubram-me o corpo de penas,
Para me abrigarem quando vier o frio,
E de toda a viagem saibam apenas

Que vivi para e por porções de tempo
No decorrer ligeiro deste meio rio
Agora deixai-me partir no vento.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Ouvindo os Pássaros

Escutando os pássaros que iam passando,
Restos de uma bruma envolviam o dia
E, quer quisesse ou não, iam ditando
Os bocadinhos do pouco que era magia,

Então cheirava a relva e respirava o mar,
Entrelinhas cabiam no que era amanhã,
E eu, hesitante, lá tentava caminhar
Passo a passo em bicos de pés de lã,

Então o firmamento tinha mudado tanto,
Quase não reconhecia aquele espelho,
Apesar de ainda me lembrar o quanto

Tinha tanto medo de me tornar velho,
Ainda era possível ouvir neste canto
A eterna criança de rasgado joelho.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Um Homem Parado No Inverno

Um homem parado, parado no Inverno,
Seu perfil meio esboçado a cinzento,
Ao passar pelo quinto céu do inferno
Vai enfim perdendo o seu intento,

À queda de estrelas cadentes ele fica,
Outras vezes segue e vai perguntando
Quando passará esta vil hora maldita
Enquanto pelos ladrilhos se vai quedando,
   
De seus olhos lágrimas e outros mares,
Lembrando-o de tudo que já perdeu
E seus mil e um seres parecem vulgares

Então vai perguntando-se se já morreu
Do Inverno brada a brados singulares   
“Ninguém morrerá se aqui já viveu.”

Restos de Pegadas

Restos de pegadas de um dia fugido,
Vendo sombras ladeadas a cinzento,
Onde estarão as maravilhas que ei sentido
Terão todas sido mais um pouco de vento?

Por onde passo nenhum pássaro chilreia,
Levantam-se vendavais e não há norte,
Um homem velho por aqui se passeia
Ante os portões ferrugentos da morte,

Anseio luz onde apenas escuridão há,
Fechando os olhos, esperando o mundo,
Aos muitos desejos que tenho por cá

Abraço-os e arrasto-os num silêncio profundo,
Assim caem deuses e se vai o amanhã
No lento gotejar da passagem de um segundo.

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Por Instantes

Por instantes via rostos desaparecidos
De tempos que rugas iam cobrindo,
Eu que os julgava algures perdidos
No trilho por onde tenho vindo

Reconhecia alguns olhares e expressões
Pertencentes a outro tempo e lugar
Que sobre mim caíam como monções
Num sono do qual não havia despertar,

Eram topos de telhados e janelas abertas
E o meu coração tão, tão cansado,
Não havia sonho pelas horas incertas

E o mundo parecia já ter terminado,
Lá ia o viandante pelas ruas desertas
Por onde a si mesmo se ia deixando.

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

As Lajes Vazias

As lajes vazias e porções da estrada,
Quando dias incompletos vão adiando
Aquela réstia de ar, um pouco de nada
Para um tiquetaque que vai passando,

Socorremos restos da lua e choramos
Esperando pela magia das horas soltas
E onde estávamos um beijo deixamos
A meios suspiros - a melhor das escoltas

Vem a noite meio apagada, sou sozinho
E dentre o que foi e entretanto já não é
Vou-me deixando pelo meu cantinho,

De costas para o sol e perdendo o dia
Houvesse um pouco mais de luz e fé
Ao passar tão vagaroso da hora tardia

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Um Beijo…

Um beijo… e o resto é deixado à estrada,
Este percurso vai sendo largado em escrita,
Onde milhares de estrelas tornam-se nada,
Pouco mais que sombras na hora maldita,

Vêm instantes que se recusam a aparecer,
Partimos na luz diáfana de recôndito lugar,
Para trás a paisagem deixa transparecer
O que em nós deixou um dia de esperar,

Mesmo de copo cheio, só mais um trago,
O rio corre e o vento sopra na rua deserta
E o poeta passa fome no meio do largo

Há quanto tempo não ouvem seus versos,
Há quanto tempo se foi pela hora incerta
Enquanto no asfalto os vê dispersos?

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Se Fosse Nas Asas e Plumas de Um Soneto

Se fosse nas asas e plumas de um soneto,
Voaria para outras margens e prados,
Faria de belo e sublime meu trajecto,
E então seria Amor por todos os lados,

Se fosse nas asas e plumas de um soneto,
Traria o Verão em cada palavra solta,
Confidenciaria à Lua em leve dueto
Uma trova fulgurante à sua volta,

Fosse eu um pouco de sol na noite escura,
Estafeta da palavra em busca anelante
Em eterna jornada em imensa aventura

Querendo só ir um pouco mais adiante
Pois não pretendo ter lar nesta sepultura
Não quero ser Vida em fôlego ofegante.

domingo, 9 de agosto de 2015

Pode Nem Parecer

Pode nem parecer, pode nem soar
Mas há dias em que não há nada
Que nos faça querer levantar
Ou até colocar o pé na estrada,

Há dias que passam sem dizer olá
E não desculpam a falta de palavras
Ao passar do tiquetaque da hora má
Cravam no peito suas mil e uma adagas,

Então coçámos a cabeça e perguntamos
Qual o ponto onde o mundo colapsou  
Onde será que ao sono nos deixámos

E porquê ter a alma limpa não bastou
Pois é ver o mundo que abandonámos
É ver aquilo que éramos e que já não sou.

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Morte Sê em Mim

Morte sê em mim, morte em mim sê,
Vem ao homem que a vida não sente,
O pássaro que o céu já não vê e crê
Morrer, só a morte o fará enfim contente,

Morte sê no homem em si perdido,
Que perdeu partes do lembrado
Que perdeu tanto do já acontecido
Que foi até em si parte do quebrado,

Não chorem sobre o seu triste caixão,
O colibri deixou de dançar e voar,
Sob o sorriso não bate um coração

Atento ao beijo, atento ao se dar
Ao abraço da aragem, de mão em mão,
Morte vem, leva o que ainda restar...

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Plumas Voando Numa Cidade Perdida

Plumas voando numa cidade perdida,
Eu seu irmão ainda de cordões atados
Porque é tão pontual a morte, a ida,
Chegará sem anunciar nos bocados

Daquele que não acompanhará o mar
Sob as estrelas que reflectem quem sou,
Na esquina da alma de quem tenta amar
O escombro da reticência que já passou,

Escutando vem a revelação da ferida,
Sem voz, os Verões que vão passando
São fragmento do instante da partida

Neste coração que se vai quebrando
Sem hora, momento ou sequer saída
Para o homem que se vai procurando.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Com Os Pássaros Partilho Esta Vista

Com os pássaros partilho esta vista,
Solitário e só através do horizonte
Por onde vou perdendo a pista
Que o que deixei atrás foi ponte,

Onde passei e as dei por findadas,
Através de cada passo fui espaço
Para cor e até asfalto das estradas
Por desbotado e até nítido traço,

Despeço-me da Vida com um beijo
Deixando uma última réstia de ar
Em mim levo tudo o que ainda vejo

Não vá eu de mim próprio estranhar
A diferença entre o anseio e desejo
Para a história que em mim tem lugar.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Sou Actor e Faço Parte da Peça

Sou actor e faço parte da peça,
Essa peça que é a vida a passar
Pela avenida e pela travessa
Onde faço este meu caminhar

Que me leva onde me deixa,
Que me vai deixando ao levar,
Por isso tento não fazer queixa,
Por isso tento não me abandonar,

Pois um dia virá em que escaparei,
Virá esse dia em que irei escapar,
Não como o que ainda procurei

Mas como quem quer encontrar
Pois não obstante do que já dei
Espero que a vida um dia soe a lar.

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Tentando Manter O Que Dista

Por vós veio um dia a morte do verão,
Delicada e silente veio devagarinho
E ao adormecer, ao passar do serão,
Ainda me podiam ouvir gritar baixinho

Os nomes das estrelas do firmamento
Que tal um rio apeavam num canto
Recitado por um coração ao vento
Era então esse da criança o encanto,

Adormecia então gigantes sem querer
Enquanto camas vazias se apinhavam
Tal folhas caídas era ver-me estremecer

Aonde não havia nem estrada nem vista
Por onde meus cantos já não se escutavam
Tentando manter o que de mim ainda dista.

domingo, 31 de maio de 2015

O Fardo de Quem Não Tem Peso

O fardo de quem não tem peso
E vai deambulando pelos dias
Sob o céu aberto sente-se preso
É vê-lo em mil e uma correrias,

Outro dia e outro horizonte perdido,
Ouçam o covarde de porta aberta,
Perde-se a hora, perde-se o sentido
Que quando o mundo passa tal oferta

O caminhante se recusa a caminhar,
Quase não há restos de bela magia
E até sítios onde se podia encontrar

Música de fundo perdeu sua melodia,
Quase não se ouve o mundo a passar
Na loucura que é o mundano dia a dia.

sábado, 30 de maio de 2015

O Tiquetaque da Hora Má

A sua voz é a possível proximidade,
O silêncio caiado pela sua presença,
Por cada palavra deixada vem a saudade
Que é largada ao esmo da indiferença,

A queda do coração é dia comum,
O cansaço de quem tanto aguarda
Os instantes em que me sinto mais um
Esquecem os bons tempos da retaguarda,

Venha a chegada seja aonde quer que seja
Desde que o dia surja e a noite se vá,
Quem dera ainda ter a luz que beija

Os contornos de quem se deixa por cá
E ao não ser o mundo todo inveja
Pelo tiquetaque da hora má...

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Uma Lágrima

Uma lágrima por todos os dias idos,
Aqueles dias em que dormi sem sono,
Aquém do horizonte jazem escondidos,
Aquém de mim são todo o meu abandono,

Uma lágrima aos dias que serão esquecidos,
Por serem pouco, por serem quase nada,
Por não chegarem a ser pois foram perdidos
Precisamente quando os colocava à alçada

De um tempo que nunca em si teve tempo,
Uma lágrima para quem não teve coragem
Pois ao ir, não foi na brisa quedou-se o alento

E do ar quentinho ficou apenas uma friagem
Ficando sem nunca ser, sendo tom de cinzento,
Caminhando o caminho sem nunca ser viagem.

Este Tempo é Cansaço

Este tempo de que sou passageiro,
Este tempo que é todo o meu cansaço,
Parece vida atirada para o bueiro,
Que soa a não vida em tudo que faço,

Do tido como maior ao mais pequeno,
Meados num silêncio feito de sono,
É olhar cerrado num gesto obsceno,
Toda a queda de uma folha ao outono,

Mãe é o teu filho que chora ao vento,
Neste cansaço feito de porções de nada,
Que é tão calado e faz-se tão barulhento

E vai deixando a alma abandonada
Pois é tanto e tanto e tanto o desalento
Que mal sinto as indentações da almofada

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Não Chega O Tempo Que Tenho

Já não me chega o tempo que tenho
Preciso de algum tempo emprestado,
Pois é neste meio ir que contenho
Todo o tempo que parece parado,

Preciso de tempo para as horas mortas
Para as ir enchendo de entulho,
É assim que pelas pontes tortas
As vou ocupando de barulho,

Assim que passam silenciosos segundos
Pela estrada que é sempre partida,
É assim que vêm e vão mundos

Preenchendo o tempo que é a vida
Onde quem não tem tempo é moribundo
Quando o tempo em si não tem saída.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

No Palco Que Vejo

No palco que vejo já não há lugar,
Lugar nem tão pouco há na plateia,
Estes tempos têm sido o deixar andar,
Só ficando uma mão cheia de areia

Que não é de quem se vê como actor
Nem tão pouco o é mero observante
É espaço não ocupado, pungente dor,
De quem não vê bem o futuro adiante,

Passam os dias parecendo noites idas
De discurso tido em silêncio calado,
Não é assim que se passam mil vidas,

Não é assim que virá a ele o destinado,
Parece só ficar um molho de dúvidas,
Parece apenas surgir o não ansiado.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Quando me For

Quando me for, dedicas-me uma elegia?
Daquelas mais antigas que o tempo em si,
Que ela traga do sonho um pouco de magia,
Que me lembre das centelhas que já prometi,

Quando me for, fazes de conta que te lembras?
Não me importo que vá ou que seja a partida,
Espero deixar algo por cá para além de sombras
Espero promover Amor sem alguma contrapartida,

Quando me for, não chorem sobre o meu caixão,
Sorrirei de sorriso aberto ante o trilho incerto,
De orelha sobre o firmamento ouvireis meu coração,

No silêncio de uma sala, esquecei esta passagem,
Apesar de totalmente imóvel estarei bem desperto
Quando deixar a terra e retomar a derradeira viagem.

Um Barquito e Um Trenó Cruzaram-se

Um barco amarelo sob um céu azul
Acenando adiante onde havia maré,
O barquito tocava as margens e a sul
Ágil ele se remetia com toda a sua fé,

Um trenó ia sobre neves esbranquiçadas
Sorrindo em frente onde havia curvas,
Lá ia ele por sendas nunca trilhadas
Por trilhos inexplorados e águas turvas,

Eis que enfim o mundo se tinha retirado,
O céu era mais azul, a neve mais branca,
Havia pássaros no ar e este era reciclado,

Um barco se cruzava com um pequeno trenó
Ao que um jovial verão ao inverno encanta
E tudo vinha e se ia, ao acordar de um ó-ó.

Esperamos Aqui

Esperamos aqui, face ao precipício do mundo,
Silenciosos de mão na alma e alma no coração,
Sendo os trapos dos farrapos e o pé do vagabundo
Aquele pequeno pedaço que almejo não ser em vão,

Esperamos aqui, de frente para o que já passou,
Mudos e silentes onde perdemos o nosso irmão,
Independentemente de quanto ele já amou,
Saibam! Era por ele que ainda sentia ter chão

Para caminhar além do horizonte, além de nós,
Mesmo quando longe parecia ele ainda chegar
Sem temor erguia-se o homem, erguia-se a voz

Para logo adormecer num cansaço reticente,
Esperamos aqui, por prometido bem-estar
Podia ele ser homem mesmo que inocente?

terça-feira, 28 de abril de 2015

De Onde Parti

De onde parti e deixei a casa um dia,
Vesti-me em trapos para não esquecer,
O assobio despreocupado, toda a ousadia,
Todo o espaço até finalmente morrer,

Por meio coração o que o realmente serena,
Anseio o vertical numa vida repleta de cor,
O monocromático não me apela nem me acena,
Não confere brilho aos rebentos de flor,

Faço deste fôlego o caderno das viagens,
A beleza perante o escape sem fuga,
Uma inteira vida entre cantos e margens

Pois ao envelhecer e da sua primeira ruga
Que faça caminho onde não há passagens
E que vá bem por onde o menos bom se conjuga.

Esta Vida é Feita de Pequenos Nadas

Esta vida é feita de pequenos nadas,
Detalhes ínfimos quase sem valor
Permitem a passagem das alvoradas
Conferindo pequenos pincéis de cor

Que vão pintando luas e sois dourados,
Coisas que amanhã se vão esquecendo
Desde que em cada instante sejam amados
São nossas mesmo que se vão perdendo

Aceitando e dando de braços bem abertos
Maior é a porção de mim em mim retida,
Passam as estações e os dias incertos

Vão ditando os intervalos de uma vida
Por um a um pequenos nadas encobertos
Nesta viagem que tenho tão querida.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

Sou a Encruzilhada Horizontal e Vertical

Sou do ser uma íngreme encruzilhada
Que é ora horizontal, ora vertical,
Submetendo-se ao vento da estrada
Algures entre o sonhado e o quase real,

Quase se renuncia ao que é do mundo,
Aquele peso das dúvidas e do mais,
E finalmente se lembra do lugar oriundo,
As bem-aventuranças, os êxtases que tais

Que são silêncio velho na mão do trabalho,
Deixando de ser pedinte por mais ego,
Todo o oceano se torna gota d’orvalho

Para não mais sentir este eu que ainda sou,
Para permitir ser a vista deixando o cego,
Para ser apenas o que é e cá chegou.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

E Se Me Perder

Se errar no meu caminho dás-me a mão?
Se cambalear sozinho e acabar por vacilar,
Dás-me um abraço que me cubra o coração
Serás o motivo que me faz sempre regressar?

Se me for e me perder ouvirás a minha voz?
Se entortar a vereda e no fim não me encontrar,
Dás-me um beijo que relembre o nosso “nós”
Naquele lugar onde esqueci o que era amar?

E se for e me esquecer que quererei um dia voltar,
Se empalidecer e não houver espaço para colorir
Dar-me-ás a outra mão, ir-me-ás a Hades buscar,
Esteja onde esteja e esteja o que estiver para vir

Não tenho tempo a perder mesmo quando não sei ir
Nem tenho ideias para onde ir ou mote para dar
Pois há vezes em que o cinzento não sabe sorrir
Há vezes em que há vezes em que não sei procurar.

domingo, 19 de abril de 2015

Ao Doce Sossego da Melancolia

Passam as horas e passa o instante
É a distância a ela que dita o futuro
Lágrimas caem muito e até bastante
Procurando então eu por luz no escuro,

Sua mão na minha era a minha na sua,
Com cordas subtis e um beijo na testa,
Parecia mentira mas era verdade crua
Era o último pedaço que em mim resta,

Pois havia alguns bocados e até porções
De beleza e um pouco de esperança
Ditando o diálogo entre dois corações,

Descendo uma escadaria após escadaria
Quase esqueço os prantos e o que cansa
Ao abraço do doce sossego da melancolia.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Salvamos Cêntimos

Salvamos cêntimos e esquecemos o agora,
Esperamos que seja encontrado o norte,
Desejamos que o tempo se vá embora
E que estes dias não findem na morte,

Pois salvamos alguns cêntimos esperançando
Com o amanhã onde corremos e amuámos
Em chuvas mil onde se vai caminhando
Aquele caminho que nem lembrámos,

Vamos não como quem vai mas como escapa
Da pluma ao orvalho da meia metade
Assim se é o meio de quem vive à socapa

E cedo se apercebe o quão tarde é tarde
Por onde vai quem no sítio ainda derrapa
Não sabendo bem se é herói ou covarde.

domingo, 5 de abril de 2015

Fez-se O Frio Lancinante da Bruma

Então fez-se o frio lancinante da bruma,
A tristeza de quem o tão belo já viu,
Do esvoaçar um fardo se tornou a pluma
E quase tudo, tudo tudo finalmente ruiu,

O murmúrio era silente e desbocado
Tal o regatear que raramente cessa,
Seria o viandante o grande culpado
Por ter acreditado na promessa

Que era de paz e luz a qualquer amigo?
Eis que agora veio a hora de dormir
Lá por cima me encontrarei contigo

Enquanto por cá enfim choramingo
É por causa de todo este sentir
Que quase já não tenho domingo.

quinta-feira, 26 de março de 2015

Um Pássaro Negro

Um pássaro negro pousa na minha janela
Olhando me bem nos olhos sem pestanejar,
Pergunta-me o que fiz nesta hora ou naquela
Se usufruí tal santo louco até ele me levar,

Um pássaro negro grasna deste alpendre,
Duas plumas de negro e branco larga
Uma que traz sonhos outra que me prende
Tal e qual esta vida ora doce ora amarga,

Um pássaro negro segue-me onde vou
Esperançando com a minha má sorte
Relembrando o quão frágil eu sou

Será ele luz ou sombra dentre a neblina
Ou me trará vida ou será a minha morte
Esperando-me porventura a cada esquina.

sábado, 21 de março de 2015

Vou Esperando: Por Ela

Vou esperando pela voz dela, moça donzela,
Espero por ela e vou aguardando assim
Desta feita fujo dos mas, escapo à cela
Que ainda habita dentro de mim,

Roubo-lhe um beijo, pastoreio-lhe outro beijo,
Sou completo ladrão e também bom pastor
Por aquilo que vou vendo assim vejo
Como se vai soletrando a palavra Amor,

Cansado, em seu regaço poiso minha cabeça
Escutando o silêncio do mundo e arredores
Passa tudo e é como que nada aconteça,

Tenho aqui o que para este mundo preciso
Pois ao menos bom vêm os esplendores
Que ainda ficam impressos neste sorriso.

quinta-feira, 19 de março de 2015

No Centro da Cidade Pt. XIX: Onde Se Respira

É quando me dobro por curvas e esquinas
Que me torno rio levado pela corrente,
Sou essa fluir de água bem cristalina
Que se lança, sem cair, em frente,

Gosto do candeeiros que voam alados,
Soltando os pássaros, a deixá-los ir,
É vê-los dispersando por vários lados
E então nesse olhar conseguir sentir

O espaço entre a terra e tudo o que é céu,
Quebrar o elo ao gatinhar, andar e correr,
Nada disto me pertence, nada é meu,

Para ir mais além, indo para a frente,
Pois aquele que vai para trás morre,
Serei então fim da noite, a luz poente.

No Centro da Cidade Pt. XVIII: Para Viver Ainda Vamos a Tempo

Este jardim entre nós tem um perfume diferente,
Percebo-o enquanto sorvo um botão de rosa,
Procurando encontrar o trilho aqui presente
Até fico um louco de tão bela e cheirosa

Que é essa flor com o seu caule hasteado
Não lhe chega neste poema dez versos
Para lhe conceder um bom bocado
Na minha ponta deste universo,

Aqui temos Lua, finalmente ela é real
Sua luz intermitente sobre a cabeça
De quem ousa ser na aurora boreal

Pássaro e asa como se não tivesse vento
Para terminar o puzzle a última peça
Pois para adejar ainda vamos a tempo.

No Centro da Cidade Pt. XVII: Perguntas ao Silêncio

Tentei ao silêncio fazer perguntas
E não obtive nenhuma resposta,
Seria ele o pai das já defuntas?
É a solidão com a proposta…

De nada ouvir e tão pouco dizer
Assim se dá vivas à ausência
Não é bem vida, é meio viver
Sem saber bem a importância,

O percurso é tudo o que faremos
Importa bem saber por onde ir,
Não obstante do que teremos

Até um certo dia dele se cair
Só importa o que seremos
Convém não dele sair.

No Centro da Cidade Pt. XVI: Restos de Uma Bruma

Ainda me envolve restos de uma bruma
E variantes do mesmo tom e coloração,
É meio névoa, meio céu aberto de uma
Manhã levada no trecho de mão em mão,

Já quase me vejo a mim próprio a partir
No branco deslizante da nuvem de algodão
E de tanto me esperar mal me sinto a ir
Até parecer que deixo para trás uma oração

Que é feita de poesia, nua e crua poesia
Como se a mágoa não fosse  nenhuma
E de repente me sinto inundado por alegria

Que parece nem sequer me pertencer
Este é o preço de quem vai na pluma
E se arrisca no entretanto a se perder.


No Centro da Cidade Pt. XV: Perdoa Mãe

Desculpa mãe, perdoa esta parte assim
Que é tantas vezes deixada ao desalento
E também por tratar tão pobremente de mim
É a cidade que me cega e me torna sonolento,

Por ter esquecido tantas vezes do importante
Lamento a entropia que hei aqui causado,
É que por vezes torno-me cavaleiro andante
Que não sabe bem por onde há cavalgado,

Perdoa-me as ofensas que contra mim causei,
Todos os momentos em que deixei andar,
Dessas tantas vezes perdoa pois nem eu sei

Por vezes o espaço entre o gatinhar e o voar
Mas acredita, fiz tudo o que pude e até amei
As ocasiões quebradas que cingem meu estar.

No Centro da Cidade Pt. XIV: De Costas...

De costas para a cidade rumou sobre o poente,
Novamente passo a passo foi para a aldeia
E o extremo frio foi-se tornando quente
Já esperava que fosse bela, não feia

Tal a cidade e seus escombros pesados,
Na aldeia havia tempo para liberdade
E tempo para estar na relva deitados,
Isso devia ser e não ter tempo ou idade,

Quero ver as nuvens passar, a grama crescer
E belos beija-flores a esvoaçar simples e leves
Apontar estrelas cadentes até deixar de as ver

Pois todo o instante é tão infinitamente breve
Que por vezes nem tem seu tempo para ser
Na grande história que uma vida escreve.

No Centro da Cidade Pt. XIII: Um Dia Ele Acordou

E um dia o viandante acordou de seu torpor
A cidade havia se tornado um fardo enorme,
Pois tinha-lhe sugado vida, tons e amor
E deixado apenas uma estranha fome

Que não era possível alguma vez saciar
Pois não se alimentava também sua asa
Então foi assim que ele voltou a caminhar
Procurando outro lugar para chamar casa,

Além do horizonte encontrou uma aldeia
E seguiu para lá, ao chegar pensou então
Cadê a não vida, cadê a morte e sua teia?

Pois aqui até tinha quem lhe desse a mão
Eram simples as pessoas e à sua ideia
Só devia estar onde preenchesse o coração.

Sonhar: A Necessidade De...

Sonhando escolho os de alegria e mágoa,
De todos eles para atiçar a chama do amor,
Esses sonhos a esboço de marca d'água,
Ao serviço de outros os coloco a seu dispor,

Peço apenas aqueles que mais alto estão
Aqueles sonhos que erigem mitos e lendas
Pois se colocar a mão sobre o coração
São os únicos dignos de serem prendas

Não engano ninguém neste andar tosco
Porém no devaneio sou mais do que eu
Sou eu e o sonhado a esvoaçar convosco

E que esbelto voar é, que choro e sorriso
Agradeço o partilhado mas nada é meu
Por isso sei que do seu brilho preciso.

Esta Breve Viagem: Ainda Está Para Ser Conhecida

Esta breve viagem é feita de mares e ventos,
Vêm as acalmias para dar vez à tempestade
E eu, entre as ondas e a orla dos tempos
Sou eu aquele que se divide em metade,

Há vezes em que vejo fragmentos deixados,
Que cante bem alto o que alma vai sentindo
Pois a passagem são bons e maus bocados
Que se escrevem no trilho que vou seguindo

Até renascer por completo como parte da estrada
Como parte da poesia que deixei ou está comigo,
Preciso de paixão e compasso para a sentir amada

Pois passando, será passada, até enfim esquecida
Pois parte de mim trago outra parte está no ido
Parte de mim já foi e outra ainda será conhecida.

No Centro da Cidade Pt. XII: Todos os Instantes

De dedos esticados para o imenso firmamento
Lembrando-se de outro tempo, de outro lugar,
Esse lembrar rapidamente se tornava tormento
Por ser devaneio longínquo difícil de alcançar,

Por isso ele caminhava sem olhar para trás
E sempre que podia apanhava pirilampos
Para sua candeia o iluminar nas horas más
Por isso a preenchia com tantos e tantos

Que subiam e desciam pela parede fora
Usando-os pela noite até chegar a manhã
Assim suportava o passar de hora a hora

Dormindo e sonhando com o que já passou
Bocas, lábios e o silêncio vindo do amanhã
Pois saibam que todo o ruído assim se calou!

No Centro da Cidade Pt. XI: Sobre Seus Ombros Vultos e Semblantes

Sobre seus ombros vultos e semblantes,
O viandante havia transverso seu confim
E agora os destinos tornavam-se distantes
E o trilho lentamente se aproximava do fim,

Um murmúrio envolvia a sombra do obscuro,
Era um pedido implorado, um grito abafado
Que alastrando-se por tudo quanto era escuro
O impregnava no trilho do vil silêncio calado,

Ora apressava-se, ora arrastava os pés em dor,
Descendo quando pretendia subir a escada
E a isto se somava à meia-luz, à falta de cor,

Enrolando-se nos cabelos da noite matinada
Apesar de longe o pouco que estava era amor
Na ausência e na tristeza então desencadeada.

quarta-feira, 18 de março de 2015

Centro da Cidade X: Estações Têm Vindo

Estações têm vindo adormecer neste rosto,
Vêm de longe e levemente esta face beijam,
Estas rugas já nem disfarçam o desgosto
Das vezes em que não fui e a idade trajam,

Cantem para mim anjos de uma outra hora,
Peguem e recomecem a velha ampulheta
Pois o tempo tem vezes em que tanto chora
Perdendo o importante no fundo da gaveta,

Por vezes ensopados ficam estes passos
Estranham-se os pés do próprio andar
É o meio tique-taque dos compassos

Que conta o Norte de quem partiu
Enquanto quem o continua a contar
Esquece das vezes que chorou - sorriu.

No Centro da Cidade Pt. IX: Caiam os Deuses

Debruçado sobre o parapeito da escada fria
Os deuses de quem éramos caem tal vaso
Quebrando-se em cacos tal como queria
Num belo e único eu disperso ao acaso,

Olhos iam olhando para os cacos do tapete,
Tal joguete, deuses tal estrelas cadentes,
Sorridentes caiam num show que  promete
Caindo em disposições felizes e contentes

Pois até que fizeram muito barulho na queda
Menos para quem tapou as suas orelhas,
Não será qualquer tempo um atirar da moeda

Mesmo para aquele que não ouviu ou viu bem
E por isso não produziu as suas centelhas,
Aqueles que as constelações não sabem
(E por isso se vão tornando velhas)...

No Centro da Cidade Pt. VIII: O Alvoroço Citadino

Com o alvoroço citadino não tinha mais tempo,
Mais tempo ou céu aberto para ver Ema bailar
Por isso lhe dedico um poema deixado ao vento,
O abraço de toda uma vida num eterno amar,

Mesmo que não a veja eu sempre a procurarei,
Posso até mesmo esquecer ou ter-me perdido
E apesar de não poder saber por onde estarei
Trago-a no meu peito bem próximo do sentido,

Esta é o relato das curvas e contra-curvas
Do louco insano correndo nu pela avenida
Reflectindo-se em lagos de águas turvas

Enfim, a cidade, essa comedora de sonhadores
Que jamais é chegada, parece sempre partida,
E o tempo nunca é tempo para seus amores.

No Centro da Cidade Pt. VII: De Costas Para a Cidade

Através do cinza passava o viandante
Esquecendo o que ficou lá para trás
Não fosse pouco era até bastante
Para lhe alegrar as manhãs,

Dava tal Cristo antes de sua cruz
Caminhando em folhas e areia
Na obscuridade deixava luz
Libertando-se da cadeia

Embelezava até o mais feio lugar
Da noite escura fazia novo dia
E como se não houvesse chegar

Partia largando a sua melodia
E como se não tivesse acabar
Voltando-se para a aldeia

No Centro da Cidade Pt. VI: A Passagem da Vida

Na berma da margem da estrada vamos embora
Somos a orla onde o rio passa silenciosamente,
Vamos sozinhos, vamos pela afluente afora
Esperando bom porto ou quem nos aguente,

Passamos todos pouco conscientes dessa passagem,
Passamos do início até ao mais parecido com o fim,
Ao passarmos o ontem passa a ser miragem
Enquanto o amanhã virá amanhã, num dia assim

Cuja única certeza é a passagem, venha o que vier,
Haja alegria, haja tristeza só tenho uma certeza
E essa é que tudo passará escolha o que escolher

E um dia, um belo dia até espero que seja eu
A passagem de toda uma vida, oh que beleza
Vê-la partida, saber que nem o fim é meu.

No Centro da Cidade Pt. V: Saudades da Aldeia

Através do cinza passava o viandante
Esquecendo o que ficou lá para trás,
Não fosse pouco era até bastante
Para lhe alegrar as manhãs,

Dava tal Cristo antes de sua cruz
Caminhando em folhas e areia
Na obscuridade deixava luz
Libertando-se da cadeia

Embelezava até o mais feio lugar,
Da noite escura fazia novo dia
E como se não houvesse chegar

Partia largando a sua melodia
E como se não tivesse acabar
Que saudades da sua aldeia.

No Centro da Cidade Pt. IV: Vestígios de Quem Passou

No seu coração vestígios da criança do Elísio,
Em suas omoplatas restos de farta plumagem,
Quando foi, quando teria apartado do paraíso
Tornando toda uma vida os ecos duma viagem?

Por vezes parecia o normal tornar-se inacessível,
Mais que tempo era a sensação do tempo passar
E era essa sensação que ao passar era indizível
Pois enfim nem sequer parecia mesmo cansar,

Porém cansava quem almejava e queria viajar
A quem tinha o mundo como pátio e varanda,
Mais parecia marinheiro perdido em alto-mar

De propósito objectivo quase sem demanda,
Vendo inúmeros rostos sem nenhum ficar
Assim era a vida de quem triste por lá anda.

O Ego: Entre o Viandante e a Lua

A noite envolve-o em abraços de cansaço
Adormecendo como se fosse petiz infante,
Sozinho despe-se dos dias e nesse pedaço
Entre o acordar e o sonho vê sua amante,

São encontros sozinhos somente entre eles,
Vai a Lua alta reflectindo-se sobre o lago
Onde ele encolhendo os ombros sente deles
Todo os universos e espaço que em mim trago,

Ele sou eu e a Lua é de todas a maior tentação
Esse lago que entre nós considero e bebo
Quando jaz plácido ou chove em vil monção

É tanto dela também e dela tudo o que sente
Em tudo o que é dele e que dele recebo
Sim sinto-o deveras, sinto-o verdadeiramente.

No Centro da Cidade Pt. III: Brilha Uma Chama Difusa‏

No meio da cidade brilha uma chama difusa,
O seu envolvente uma noite já esquecida
Por entre lembranças de memória oclusa,
Pergunta-se ele quando verá sua partida,

A cidade não é casa,  não tem sequer intento
De permanecer mais tempo, de por lá ficar...
Oh apetece-lhe correr e apanhar o vento
E na cidade para isso não há sequer lugar,

Cabisbaixo o viandante percebe sua ausência,
O quão difícil é pertencer às coisas pequenas
E desses detalhes conseguir encontrar pertença

No coração sentir Amor, Amor a sério esse expoente
Pois assim o homem livre tinha como prisão sua pena
E igual se ia tornando aquele que cresceu diferente.

No Centro da Cidade Pt. II: Atrás do Eclipsado

Atrás do já eclipsado vejo a margem ida,
Esperanço o que o horizonte alcança,
Até posso ver em frente a margem querida
Ficando feliz que nem brincalhona criança,

Os seus sorrisos são tão bonitos, tão leves,
Estranho como a cidade sem dó os asfixia,
Vem a vez da noite ficando os dias breves
Será fácil esquecer a criança e sua melodia?

Pois sem ela parece-me bem natural morrer,
Ocultam-se vindoiros sois em sem verdades
Que triste o viandante esqueceu seu querer

E do quase esquecido regressam as saudades,
Ao caminho que era dele, aonde podia ser,
Enquanto o tempo vinha de idade a idade.

No Centro da Cidade: O Viandante Chegou à Cidade‏

Passos ecoam os sons da sepultura,
Finalmente havia chegado à cidade,
O dia era breu, era aparente amargura
E o passado deixava restos de saudade,

Então cabia bem num minúsculo frasco
A inteira alma do contemporâneo Homem,
Cada passo mais parecia pulo em penhasco,
Que de desordem cega as forças se tomem,

Era o prazer citadino de ser um pouco menos
Para caber nos sapatos rotos do proletariado,
Até os passos se tornavam mais pequenos,

A arduidade de ter um lar fazia-o de refugiado,
Quedava-se sem respirar por obscuros terrenos
Era o torpor citadino que o havia asfixiado.


terça-feira, 17 de março de 2015

Cinco Dias: Fechado Entre Quatro Paredes

Fechado entre estas quatro paredes
Sem ter mesmo para onde poder ir
Malabarismo de nada sem redes
Cinco dias que já foram antes de vir,

O tempo é queda em esquecimento,
Os dias que parecem iguais entre si,
Monossilábico torna-se o pensamento
Reacendendo as vezes em que morri,

Não há fim-de-semana que aguente
O entre segundas a sextas vencidas
Que mais que vida parece acidente

Desalento no olhar, tristeza no pisar
Precisado de ser e nas vindas e idas
Antes que perdido volte a quebrar.

Em Conversa: Com o Velhote que Serei

Ele pedia e implorava por instantes almejados
Que corriam quase nus e de pés descalços,
De ocasiões que ninguém tinha por ansiados
Em vistosos espelhos que pareciam quase falsos,

Perguntava-me de baixinho qual seria o propósito,
Eu respondia, ainda mais baixo, que o tinha perdido,
Ficava então um ambiente meio estranho, meio esquisito,
Que há muito o havia deixado na berma do já vivido

E essa conversa só interessava ao velhote do fim da linha,
Passava ao lado de todos os que viviam e não reparavam,
Eu olhava para ele e questionava o que tinha ou não tinha

Sido verdade ou miragem ao passar dos longínquos horizontes,
Onde, quando, porquê? Isso só o sabia quem por eles passaram
Enquanto ele esperava ao passar de seus segundos e suas pontes.

domingo, 15 de março de 2015

Veio a Saudade: Que a Confusão Empresta

Veio a saudade de quem não vem,
A ânsia de quem nunca bem esteve,
É a vida a não perguntar a quem
É o homem que nada tem e tudo deve,

Veio o querer tão, tão não querido,
Que é meia vida logo é inteira morte,
A eterna dúvida de se se há vivido,
Só aos mortos está reservada tal sorte,

Veio a dor de barriga, a ânsia aguerrida,
O caroço na garganta, o suor na testa,
De qual simpatia a vida se tem sofrida

Abafada pelo clamor da aparente festa
É o medo a matar, o início da despedida
O fragmento que só a confusão empresta.

sábado, 14 de março de 2015

Tão Esbelta: Deixou-se à Maré

Tão esbelta deixou-se à volúpia da maré,
Desinteressada do que estava para vir,
Esta é a maneira em que o mundo é
O responsável que dita o que sentir,

Tão delicada e frágil era seu adormecer,
Estendida sobre a vastidão do areal
Era como uma queda d'água a se verter
Na minha mente em cenário tão irreal,

Que até se me faltava o estro do ágil poeta,
Vendo-a ao longe em plena feminilidade
Com cores e enfoque tal leve borboleta

Então até parecia não haver tempo ou idade
Para a distracção, para a atenção incompleta,
Para este momento de gentil e leve ebriedade.

O Morro dos Ventos Uivantes Pt. II: Onde Nasci

Fui dado à luz sozinho no morro dos ventos uivantes
Sentindo corrente de ar como se fosse um foragido
Onde os vivos e os mortos nunca estão distantes,
Pois os mortos estão mortos pois nunca hão vivido,

Até o viandante se perde entre os seus muitos caminhos,
Lentamente esquecendo onde foi e até quando ficou
Porém de todos esses passados sítios trouxe vizinhos
Apesar de por vezes parecer que ao tempo a si se deixou,

E envelhecendo foi rejuvenescendo a alma e a sabedoria
Mesmo quando se sentia envelhecido e sem nada a dizer
Havia vezes que dizia a si querer o que não queria

Apenas para ele saber o que era ter o que não ter
Acreditava que para os normais era sempre dia
Até mesmo quando a noite era breu sobre seu ser.

Ruas Estreitas e Esquinas: Ditam A Passagem

Ruas estreitas e esquinas ditam a passagem
De quem esqueceu um dia seu caminhar
Onde chuviscos são as poças da viagem
Só tendo a companhia do rosto lunar,

Que é a Lua, não as cópias que são dela,
Portanto enaltecem o próprio sorriso,
Vamos colhendo estrela a estrela
De mão esticadas e olhar impreciso,

Vou sabendo que sois meu grande Amor,
Este buquê de estrelas preservei para vós
Minha alma, minha vida de flor em flor

Num eterno beijo remetido nesta voz
Só para e por nós tanta e tanta cor
Para enfim vermos o que vem após.

segunda-feira, 9 de março de 2015

Fez-se Primaveril: A Espera

Hoje é diferente, não é um dia qualquer,
Hoje é o primeiro dia de Primavera
Que beijando tal afectuosa mulher
Faz valer todo o tempo de espera,

Hoje há brisa e a doce, doce acalmia
Do voejar belo e alado do beija-flor,
Há pedaço de vida, há mesmo poesia
Somente do devaneio do sonhador,

Hoje verei ondas a beijar grãos de areia
E o que acontece a quem não repara,
Oh que sorte, que esplêndida melopeia

Que os vagantes docemente ampara
Até o por do sol de quem saboreia
O amanhã de quem não o prepara.

sábado, 7 de março de 2015

Há Noites Pt. II: Que Vêm De Cabelos Soltos

A noite é Oressa de cabelos soltos,
Pavoneando-se sedutora entre sois
Eu, foragido ninguém entre vultos,
Toda uma multidão entre nós os dois

Ema é a estrela do norte, esperançado,
A chegada além deste entre margens
Que enaltece o fulgor do alcançado,
A porta para o Elísio de outras viagens

Esperamos Rosas, ofertas do rosto lunar
De gritos indagando no sobressalto,
Quando se é que haverá um dia lugar

Para dias com a Lua hasteada bem alto
Pois só tentámos resgatar da vida o Amar
Mesmo quando caímos de face no asfalto.

Cada Poema: É Um Bocadinho de Mim

Cada poema é um bocadinho de mim
E cada estrofe um pensamento,
Divido-me em literatura pois é assim
Que por capítulo capturo o momento

Perfeito entre a métrica e a dicção,
Medido entre a prosa e o soneto
Sentido no bater deste coração
Ou morto na vogal muda do objecto

Vibrante no verso, na pausa e acento,
Na estrutura da rima, forma de vida
Por onde me levar o improviso do vento,

É assim que a terna literatura vai e vem
Ganhando cores pela viagem querida,
Pertencendo a todos sendo de ninguém.

quarta-feira, 4 de março de 2015

Há Noites: Que Chovem em Nós

Há noites que se deitam de olhos fechados
Num silêncio inexpugnável que sem acordar
Relembra a ponte e os segundos passados
As mãos presas na freima de tanto chorar,

E desse chorar os homens ouvirão meu canto
Virão das províncias de tão alto ele entoar
Serão para eles fealdade ou então encanto
Cutucando-me com o frio de um único olhar,

Somos o náufrago de uma paisagem imensa
Que um dia foi tela e moldura pertencida
E era essa beleza mais ou menos suspensa

Que dizia aos homens o que era ser na Vida,
Hoje esperámos o póstumo como recompensa
Para quem em si chove e não a tem bem vivida.

Há Vida: Antes da Queda da Madrugada

O tema vai-se perdendo neste lugar
Fica-se meio lágrima, meio sorriso
Sem hora para dormir ou acordar
E aprender o que para viver é preciso,

Há coisas que se escondem atrás do Sol
Que fulgor e melhor brilho mostram
Quando as nuvens se tornam lençol
E os apetites descuram do que gostam

Pois uma flor nem sempre é uma flor,
Nem todos os campos são uma vida,
Não significa que em si têm desamor 

Ou que são simples sítio para partida,
Há que ir e ter a nossa luz resgatada
Antes que em nós caia a madrugada

Se Fosse: Algo

Se fosse um pouco igual, ver-me-ias como irmão?
Se não tivesse estas asas e sonhos nos pés
Terias então para mim uma bela canção
E não o outro pouco que o homem por cá fez?

Se fosse um pouco menos, ver-me-ias como pai?
Se não tivesse vertigens e medo do escuro,
Não fosse eu saída para o que do Elísio sai
Lembrar-me-ias o quão este trecho pode ser duro?

Se fosse um pouco mais, ver-me-ias como filho?
Se tivesse sítio para as estrelas por resfolegar
Seriam minhas as pegadas deixadas no trilho

E se simplesmente fosse mais ou menos diferente,
Saberia quando para ficar e quando ir há lugar
Teria então esse espaço para ser no presente?


segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

As Coisas Que Se Escondem Atrás do Sol: Vai o Petiz

Vai o petiz jogando com a bola amarela
Atravessando sem olhar para os dois lados,
Tem tanto para ver, tanta vista e janela
Amem-no no silêncio lento dos bocados

Que é de quem vê a Lua quando alvorece,
Do tempo que é passado, do tempo vão,
Quebrando o brilho que a noite esquece
Sob o firmamento ainda jaz seu coração,

De quem anseia, que treslouca o estranho,
Quem será que um dia lhe dará a mão
À rés tresmalhada a alhear-se do rebanho,

Por olhos pintados pela sombra dum anzol
É outro ponto hasteado na sua constelação
São as coisas que se escondem atrás do Sol.

Jardim de Ideias Pt. II: O Céu que o Abriga

O céu que abriga o verdejante jardim
É de todos que ousam viajar ao relento
Viajando com ou sem intenção é assim
Que se vai recobrando a cor do vento,

Vamos indo em valsas ao pé-coxinho
Com uma lágrima no canto do sorriso
E ir vamos indo rápido ou devagarinho
Valsando sós nesta dança do improviso

Entre margens quantas vezes perdemos
A razão, a sazão, a oportunidade de ser,
Até na perda é bom que caminhemos

Pois ai também há fracções de verdade
Nesse jardim que ousamos viver e morrer
Entre margens pelo jardim da eternidade.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Jardim de Ideias: Marca d'Água

Palavras do jardim acenando a mão,
Vidros sob o pulsar de cada passada,
Dos meus dedos saem para o caixão
Indo-se esvaecer para a madrugada,

Adormece-se admirando-se pontos a sul,
Moinhos e giestas são esta a paisagem,
Rascunhada a marca de água azul
Quantas vezes foi esta viagem viagem?

São pontos a sul, ideias de outro tempo
Tudo me parece pouco, tudo é pouco,
Por onde for que me disperse o vento,

O sono hoje beija-me com lábios de cetim,
Esquecendo a razão, era então mouco,
Quando foi que nos perdemos neste jardim?

Soneto para Ester: Marcado a Água

A solidão passeia-se por fotografias
Trazendo-me instantes da sua voz,
Relembrando o que era dia a dia
Eram instantes sim, eramos nós,

Por onde sorrires é onde eu sorrio
Por onde fores espero ir também
Porque haja calor ou haja frio
Sei que iremos muito mais além,

Nem me preocupa mais o futuro
Desde que seja feito contigo
A dois haja luz ou este escuro

Por onde eu for vem comigo
Havemos de passar o obscuro
Não temas… em mim encontrarás abrigo.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

A Sala Pt. II: O Homem Invisível

Não me apoquentem, sou o Homem Invisível!!!
Não tenho passado, é a vida que passa
Sem ideia ou plano do que é exequível,
Apenas mais um zé-ninguém na praça

Onde todos passam e ninguém o é
Para além do alguém que tentam ser,
São ideias e planos feitos de boa-fé
Que se vão indo pelo meio querer

Pois esse até é mas vai morrinhando,
Tal e qual como o homem que passa
Que em si mesmo vai chuviscando,

Atentai sou o temeroso homem invisível,
Que perdeu as suas letras maiúsculas,
A quem tudo parece ser impossível.

A Sala: Onde Todos Nos Vêem E Continuámos Invisíveis

Dão-me um osso de roer para o prato
E esperam que use talheres de prata,
Fingem não ver quão magro é o fato
Vendendo promessas com toda a lata

De quem tem voz mas não tem preceito
Pois afinal não há mesmo nada a dizer,
Aos que não vêem parece preconceito
A verdade é que não há que escolher

Pois a escolha já foi feita por um outro,
Esganando a trela envolta ao pescoço,
Lá vai a rés desgarrada, o indómito potro,

Vai contra a parede - o coração couve,
Engolido na falta de solução, o alvoroço,
De quem ouve falar mas ninguém ouve.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Um Quarto Com Vista Pt. II: Por Mim

O quarto com vista de olhos fechados,
Entre dois a mais bela emboscada,
De pés descalços num destes bocados
Devagar devagarinho a hora passada

É espaço para os segundos da viagem,
Vê-los até ao silêncio - "Tiquetaque, tiquetaque"
- Diz o relógio à ampulheta da outra margem
Tantas estradas para colocar no almanaque,

Por mim eu, os segundos e a sua ponte
Mesmo que através e entre nada for
Que encontre no coração razão e fonte

Que não esqueça o toque de uma flor
E tenha sempre os olhos no horizonte
Pois só daí vem o vero brilho e a cor.

domingo, 8 de fevereiro de 2015

Um Quarto Com Vista: De Olhos Bem Fechados

Um quarto com vista e lavandaria,
É a insuportável leveza deste ser,
Estrelas e barras o restante do dia,
Dizem o que querem, o meu querer,

Por onde anjos receiam caminhar eu vou,
A idade da inocência, as asas da pomba,
Num coração de poeta que tanto voou
Que é conversa suja das mulheres, a lomba

São as cinquenta sombras de cinzento
Cada ínfimo detalhe, cada pormenor,
De olhos fechados num novo alento

Para o retrato sincero a tê-lo correcto
A teoria para tudo vista pelo beija-flor
Assim o farei ao despir-me deste tecto

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Entre Dois Pt. III: A Mais Bela Emboscada

Somos dois, indo lado a lado
Enfim somos um pouco de nós
Mesmo que só por um bocado,
Sim, finalmente não estamos sós,

Esta viagem é tão e tão sozinha,
E quão difícil é ir sempre comigo,
É longa a viagem para quem caminha
Vem comigo pois ora segues ora eu sigo,

Sê comigo a esbelta estrela cadente,
… Até o irei supor desta minha ânsia
Sejamos o Srª. Infeliz ou a Sr. Contente

Duas margens e enfim virá a madrugada
Entre nós dois nem sei bem a distância,
... Não é o Amor a mais bela emboscada?

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

De Pés Descalços Pt. II: Outro Dia

Outro dia, outro dia a si tão igual
Ao ontem que ainda é o hoje,
É tempo que vai e vem tão banal,
É um resto de vida que de mim foge,

Outro dia, outro dia a si tão igual,
Do amanhã e sua dura incerteza
Abre-se a mente à doença mental,
Some-se a ideia, a reflexão, a clareza,

Perde-se o tempo entre seis paredes,
Sussurros e murmúrios de quem parte,
No barulho de fundo, tu que concedes

A sina do poeta louco, o estandarte
Que poucos ousam içar em público
Assim a se substituir Vénus por Marte.

De Pés Descalços: Um Bocadinho de Mim

Eu de pés descalços e um bocadinho de ti,
Aqueles que meio era, não fui ao quebrar
E daqueles que nem souberam bem de si,
Será que só quem se busca em si acha o lar?…

Eu sou eles, e eles são mais do que muitos,
Em tanta fealdade há sempre algum lindo
Mas todos são meio oferecidos, até gratuitos,
Uns morrem, outros partem (não partindo),

Há que olhar pelo ombro, ter cuidado!
Por cada passo não dado e vertido
Aquele que não tem cautela, coitado

Para o bem e para o mal cá respingo
Tal rei desgarrado, a cinza colorido
Eu sei, eu quase não tenho domingo.

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Tiquetaque, Tiquetaque Pt. III: O Manancial

Devagar diz o relógio à ampulheta
Ambos eram e serão o viandante,
Tiquetaque, tiquetaque vai o poeta
Deixando segundos no belo instante,

É belo pois é sempre temporário,
É meio triste pois é meio sozinho,
Não olha a agendas nem horário
Vou esperançando pois há caminho

Até quando sou beata em cinzeiro
Ou pura fracção, um seu bocado
Que é resto do maior, do inteiro

Para a pegada, para o seu potencial,
Meio sozinho, meio acompanhado,
Ser de quem cria e é manancial.

Tiquetaque, Tiquetaque Pt. II: Ninguém Sou Eu!

Ninguém sou eu, eu sou ninguém!
Quando em mim Rosa aparece,
Por vezes nem sei qual ou quem
Em mim mesmo, mesmo acontece...

A subtil pancada sempre insistente
Que consome o bom samaritano,
A cinza dos escritórios, o fervor do utente,
A propensão para a mentira, o engano,

Na cidade há tanta dor escondida,
Tanta proximidade sem se estar perto,
Até a verdade é facilmente sacudida,

Tanto ruído de fundo, tanto desdém
Parece oásis em infindável deserto
Mas é só miragem, lar de ninguém...

Eu Sem Lua: Sou de Rosa a Ema (Poema Para Ester)

Eu sem Lua sou azul sob o lago,
A Rosa triste que vai e que vem,
Água nos pulmões, o olhar vago
Procurando Ema e vendo Ninguém,

Que saudade de ver parte da Vida,
Que vontade pela menina do além,
Este mundano, esta insana lida
É oásis e miragem lar de ninguém,

Ester para a semana terá partido,
Levando este coração na mão
Que seja esse o prelúdio do ido,

Sobre vós vejo a Lua e a bailante Ema,
Cada instante, tão sacro e tão vão,
De Rosa a Ema, vos dedico este poema...

(Então levai-o em vosso coração).

Devagar Devagarinho Pt. II: A Espera por Ester

Devagar devagarinho vai ágil Ester
Ela só mais um pequeno grão estelar
Largando-se ao ir mas sem perceber
Se algum dia há-de sequer chegar,

Devagar devagarinho e com tanto medo,
O desconhecido é lar para a ânsia
E o que vem chega tarde ou cedo
Mas sempre chega não importa a distância,

Nem sei se ela conseguia respirar por lá,
Terá o universo para todos oxigénio?
Porém esperava a sua chegada cá

Por entre suspiros e o desassossego
Cada hora mais parecia um milénio
Quanto mais tempo até seu aconchego?

Devagar Devagarinho: Cai a Cadente (Poema para Ester)

Devagar devagarinho cai a cadente,
Seu percurso na abóbada terminado,
Parece tão momentâneo, tão presente
Que nem nos parece que tenha passado,

Devagar devagarinho fluindo no éter,
Por entre galáxias e nebulosas,
Esta cadente relembrava-me Ester
E os milénios tornavam-se em horas,

A passagem era de obstinação e espera,
Tanto para Ester, a cadente viajante,
Como para o observante que se escondera

Da vertigem da Viagem daquele instante
Que fazia do visto mais do que ele era:
Um aceno para o finito tempo restante.

Tiquetaque, Tiquetaque: Diz o Relógio e a Ampulheta

Tiquetaque, tiquetaque o relógio do louco diz,
Quebra-se-lhe a alma mas um dia será feliz,
Chovem ideias e pensamentos maculados,
Olhos secos e de tanto chorar borratados,

Esses olhos só vê quem olhar para dentro
Porém lá vem o tiquetaque barulhento
De um olhar de vários olhares sobre mim
A este lar cinza não chega nem o serafim,

É o ranger das janelas e o bater das portas,
Será a poesia doença na praça pública?
Sim, sim, Deus escreve certo por linhas tortas

Portanto salvé aos doidos e ámen loucura!
Quando não há mente não se simplifica,
Dorme-se sim em cinco dias de amargura.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

A Ela Um Muito Obrigado: Vida Malembe Malembe

Os olhos nos olhos e mão na cintura,
Vida cadáver quanto temos dançado,
De joelhos no chão em pertença à loucura
- A ela... doce farol, um muito obrigado,

Até vale a pena viver mais um segundo,
Assim se eleva o ânimo ao exumado,
Ela é o lar doce lar para o vagabundo,
É a ela! Doce farol… um muito obrigado,

Por vezes estranha-se o filho do próprio pai,
Corre o dia, vida triste, vida avariada,
Do homem que a ele próprio se trai

Não sendo ou vendo a luz, só enxurrada,
São vezes em que a treva sobre mim cai
Salvo ela... doce farol, um muito obrigada.

A Distância: Entre o Poeta e a Amada

Por oblíquo arco sua mão esticada
Para uma outra margem em busca,
A distância aos ombros carregada
E não obstante do quanto custa

A ida - a dificuldade desta espera,
O desenfreio - pertença do poeta,
Da noção criada tal arisca quimera,
Esse muy nobre objectivo sem meta

Até quando nem em si tem pertença
Porque apenas há bruma enevoada,
Parece-me que essa é a sentença

Para quem ousa fazer a caminhada
Onde se vai contando a diferença
Da distância entre o poeta e a sua amada.