domingo, 31 de outubro de 2021

Escravos do Tempo

Os relógios assim vão extinguindo o fogo da Vida, 
Sinto os minutos a passar tal paisagem fugidia,
Contando os segundos até à margem querida,
São as areias do tempo elidindo a noite vadia, 

Os sapatos sujos de lama ecoando na passagem,
Da alma junto da mente, da carne virando osso, 
Estes rastos esboçados pela poeira da viagem,
De passada em passada enviada para o poço, 

Vou lentamente esquecendo o meu nome, silêncio, 
Somos todos escravos do tempo, assim vai o vento,
Levando pedaços de nós com ele, assim vivencio

Que a Vida vai sendo trocada por rugas e cabelos grisalhos
E que o que fica são os bocados, momentos e seu alento
Confere a Vida deixada, talvez trocada tal queda de orvalhos.

domingo, 24 de outubro de 2021

Por Vezes Lembro-me

As vigílias destas ruínas tecem da noite segredos, 
Perscrutando linhas do horizonte, eternas pontes,
Tal corpos arqueados sobre o oceano e estes dedos,
Esplendores maravilhosos, brotam mil e uma fontes,

De onde permaneço há ainda para ver novos luares,
Numa espécie de melancolia que me leva o dia a dia,
Que sussurra ao ouvido a ausência de novos lugares,
Que abolem novos caminhos para o que então seria

Alguém novo em improviso de colibri, o seu perfume,
O infinito geminado na palma da mão, a imortal paixão, 
Entre lençóis, o silêncio de braços procurando o ardume

Que não surge, a lembrança de um sono, um pacto quebrado, 
E é ai que reparamos que a saudade é maior do que o coração
Consegue albergar, mais do que sangue a estancar, que o amado.

quarta-feira, 20 de outubro de 2021

O Tempo E A Sua Inevitabilidade

Desabafo meus pronomes tal folha outonal, 
Talvez não caiam para baixo como é suposto,
Explicam o silêncio de um amor incondicional
Partindo de uma ponte onde o andar é proposto

Por quem o vê a passar de uma margem direita, 
Será que basta ser metade nestes dias de outrora?
Caminho nu e sozinho por uma ruela tão estreita,
Caminho nu para ser encontrado por uma aurora, 

Vou indo em desprendida pressa, vou indo discreto
Em arremesso certeiro, na muche, mas ao seu lado,
A carícia do relógio, a ampulheta mudando o afecto

De quem percorre os ponteiros de areia, o inevitável
É só o agora nas órbitas de uma pelicula cujo fado
É destino e balada perante o tido como indubitável.

quinta-feira, 14 de outubro de 2021

Esta Poesia É Ardor

Aprendemos que uma promessa não é um talvez,
Ardendo cartas antigas de candeias feitas de amor,
Procurando agulhas em palheiros outra vez,
Especado a olhar o sol, estes olhos retratos para o ardor

Que sente quem lacrimejou um outrora,
Em moções silenciosas, o peso aos ombros do inverno
É suficiente para até ir esquecendo a  aurora
Enquanto se rascunham pestanas num  caderno,

Porém, a tragédia é que ainda em anjos acredito,
Fotos empilhadas em contentores do lixo
Trazem memórias da sua face de cor e por escrito

Pois sua voz são os meus silêncios, a acalmia
Diante a tempestade, diante o requebrar do esguicho,
E a obra de arte, a despedida no aceno desta poesia.

domingo, 3 de outubro de 2021

A Vida Ainda Está Por Começar

Trago-te nos nódulos dos dedos, neste olhar, 
Nos abraços conferidos, na pele sobre a pele, 
Nos lábios fantasma, na revolução do beijar, 
Nas caricias nos braços, na canção que impele

Estes versos, que faz o sol em mim ainda brilhar, 
Por favor, permite-me um dia nunca esquecer,
São estas palavras que travam a língua, o retornar
De uma brisa a espreitar-lhe no cabelo, a estremecer,

Trago-te descalça e branda numa moção levezinha, 
Numa alvorada sobre a enseada da outra margem
Que parece por vezes anoitecer pela noite vizinha,

Entre cortinas, havemos um dia ainda de escapar
Desta vida que é morte, que não é sequer viagem
Acredita amor meu a vida ainda está por começar!
 

Entre Mim e Eu - Uma Distância a Percorrer

Há entre mim e eu uma distância a percorrer,
Um desejo por dar por cumprido, um anseio, 
Pois de tantos beijos dados nem sei o que ser
Parece que de tantos ter sido me perdi no enseio,

Era agora dormir para verter dos olhos o silêncio, 
A lembrança de dois lábios em e por si embriagados, 
Melancolicamente bonito, o instante que vivencio,
Lugares que trazem o verão, pássaros voando liberados,

Atirando seixos para os solavancos, sem sítio para mim,
Hoje, como estranho nas entranhas esta sua ausência,
Esta solidão infligida, o coração entreaberto, o sim,

O não, este conter o oxigénio por debaixo de um rio,  
Não obstante do mundo, trouxeste-me esta poesia,
Então quando me recordo, recordo-me de ti... e sorrio.