terça-feira, 30 de abril de 2013

Eu, Tal Orfeu Pt.III: Saltitava, Submerso no Viandante

Aquelas eram as noites dos três murmúrios distantes.
Esboçando sorrisos suspirava através da branda brisa
Que rodopiava em espirais por escadarias ondulantes,
De mãos e braços esticados à Lua estava Rosa - a poetisa.

Ema espreitava, porém raramente olhava para baixo,
Saltitava de nuvem em nuvem sempre amorosa e ligeira
Confundindo-a com Orfeu apenas algumas pegadas abaixo,
Esse viajando dentre avantesmas largando o trilho à poeira,

Por vezes tomava Rosa por Eurídice e invitava-se ao escape,
Essa fuga era para o Sonho de Ema ou para o sono de Rosa,
Que nem Ícaro esvoaçava desenfreado entre Vénus e Marte,

Arrebatado ele era o pouco demasiado, o poema em prosa
Em vagão destravado, o caldo entornado no que é à parte
Nesta propensão à grande ascensão e à queda buliçosa.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

À Brisa e ao Mar Pt. II: A Aldeia da Criança e do Velho.

Hoje não, não haverá o vulgar alarido da mente,
Ela é aldeia e sossego situada em lugar incógnito,
Envolvida por água cristalina iria contra a corrente
Porém não hoje, hoje não há lugar para tal frémito,

Hoje são, são passarinhos a bailar e flores a crescer,
É hora de apanhar e soltar borboletas após o beijo,
Até quase caio na tonta ousadia de voltar a crer
Que o Universo é tão sublime tal e qual como o vejo,

Tudo é maravilha quando envolvido em mãos de criança,
Este olhar torna-se pólen voador, sorriso e bola de sabão
De lado para lado nessa tão esporádica e delicada dança,

Tão sincera como a lágrima que lhe delineia o semblante
Que embala o velho para o sonho nesta bonita canção
E que à chegada ambos acomoda dentro do viandante.

À Brisa e ao Mar: (Em Maresia) Pintando Escadarias para o Céu

Aqueles eram os tempos do não olhar para trás
Deslizávamos distraídos atrás do candor da maré,
Nossos lábios entre o azul e o vermelho eram lilás
Tolhidos pelas suaves ondas contudo em tal banzé

Que Deus era através de nós e nós éramos através dele,
Seguindo o Sol fazendo escadarias para o horizonte
Poucos percebiam o precioso sorriso que era daquele
Instante cativo e que de resto era a nascença da fonte,

Vinham as planícies, os vales, as montanhas e os penhascos
O viandante apenas era quando a brisa se reflectia no rosto
Cujo melífluo sabor preservava num multicolorido frasco…

Para tragar pela viagem e para beber o outrora eclipsado,
A berma da estrada para a cabeça era aprazível encosto,
Para sorrir e chorar às pegadas, para sustentar o ansiado.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Ao Sono: Pois Permite a Concretização do Sonhado

O recosto da almofada dá este dia por acabado...
Assim cedi, eventualmente sendo pela alvorada
Entre o despertar e o acordar então retratado
A pinceis suaves e borrões de sulcos da estrada

Que tudo me dão e que neste ir nunca dão nada,
Há portanto de aproveitar a brisa desta paisagem,
Respirá-la, senti-la e sê-la por onde ela for levada,
Da alta e baixa sou e faço parte tal como a folhagem

Que esvoaça e é pisada porém de vista no horizonte
Vale sempre a pena, vale sempre a pena quando se é
Pois o tudo e nada são irmãos que precisam de ponte

Para tudo o que é e certamente foi e talvez um dia seja
Em mim… sempre enfrentando o céu e o abismo até
Que durma… Perceba o porquê… e que enfim Veja.

Truz-truz-truz: ... Assentado

Este sono é pertença entre pálpebras semicerradas
Onde os cantos das paredes escutam as confidências
Feitas ao rosto da lua quando só a lua nova é escada
Para o sublime pincelado onde se esboçam as ausências

De quem por lá passou e ora as desceu ou então as subiu,
Deixado para trás ficou o aqui neste ténue almejo suspirado,
O sonhado concretizado que este olhar um belo outrora viu,
Gentil e suave, como batidas sobre o caixão levemente baixado

Truz… truz… truz… seu semblante é neste tão formoso sorriso
Chorado por diferentes segundos alguém num dia já percorrido
E tornado passado em tal rapidez através do meandro indeciso   

Que por vezes até duvido que a Vida tenha realmente acontecido…
Vem sono, traz-me o Sonho, da sua concretização ainda preciso
Pois o ser na Vida para um dia beijar bem a morte assim faz sentido.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Por Mundos e Mundos Pt. II: Aonde a Brisa ou a Tormenta o Levar

Através da vista onde ainda a trago, revisto a vida,
Seu reflexo é óbvio no sincero beijar do beija-flor
Que traz o coração à flor, dá-lhe cor e à despedida
Não pergunta se deu ou recebeu pois ambos são amor,

A brisa é a passageira por onde ele esvoaça alado,
Há mundos e mundos todavia apenas um beijar,
Ao vê-lo no ar dá para apontar o rasto deixado
Onde rodopia e parte pois ainda não aprendeu a ficar,

De instantes vem a espera, o esvoaçar e a nova partida,
Para esquecer as gotas do tempo que bebia outrora
Fazia por deslembrar aquelas três palavras na Vida,

Tentava e estrebuchava, tentava e cambaleava torto,
Ferido, compreendia tudo, percebia todos e à demora
Do tempo o mundo não passava e ele tombava morto.

Há Mundos e Mundos: Porém Apenas Um Beijo do Petiz Beija-Flor

“Olá, Eu Amo-Vos, Adeus”: quando o dia termina
Soluços pendem aquelas palavras e frases inauditas,
São nos restos fragmentados que ofuscam a lamparina
Que se prostra de joelhos a vida face às horas malditas,

Já nem apetece respirar ou escutar o bater do coração,
A criança que catraiava jaz neste seu vil silêncio interior,
Visito-a por vezes nos riachos onde tento dar-lhe a mão
Onde raramente sei se a deixo ir ou a embalo num cobertor,

O beija-flor raramente repara no que é na sua proximidade
Contudo quando beija uma, ela torna-se no seu amor, seu tudo,
A sua saúde por aquele sorriso, das suas lágrimas - a enfermidade

Porém nada, nem este céu em redor delas ou a sua cor são meus
Tenho sempre em mente que a brisa passa por aqui sobretudo
Por isso ao vê-la sempre digo: “Olá, Eu Amo-Vos e Adeus”.

Sobre o Reflexo: Através da Vista Onde a Trago e o Revisto

Aproximai-vos e espreitai para o espelho
Através do canto deste plácido olhar,
Dizei-me, vislumbrais o miúdo ou o velho
Que este rapaz foi e que um dia se irá tornar?

Ou vedes o instante neste actual presente
Por vezes invocado pela noite infinda
Outras onde é o abrir da aurora luzente?
Quando o partir tantas vezes soa a revinda

Ao sítio donde partimos naquele outrora
Polvilhado na vista, no reflexo inda vos vejo,
Trago-vos em cada olhar por cada arquejo

(…em cada agora…)

Seremos o reflectido ou aquilo que supomos (Ser reflectido?)
Ouvi! Parti todos os espelhos e nesse lampejo
Que eles nos mostrem por fim quem somos.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Sobre o Coreto Onírico: … E as Pegadas na Areia

Meia pegada deixada no rosto da areia,
Aqui somos o fragmento do dia incompleto
Pela noite dentro o avistar da luz encandeia
Vacilámos pois errantes na ausência do coreto,

Uma pegada dada, de pé em pé a salto
Aqui pulámos e andamos ao pé-coxinho,
O mundo precipita-se em imenso sobressalto
Hesitámos sim… mas vamos indo devagarinho,

Duas pegadas na areia e deslizámos enfim,
A viagem é a brisa no rosto e o vento o rasto
E que frescos ambos são ao passar por mim,

(Agora…) Quatro pegadas eventualmente serão uma,
Cobrirão então toda a porção deste areal tão vasto
Sim, ainda voaremos leves no adejar dessa pluma.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

As Suas Flores Pt. II: De Instantes Vem a Espera

Pensávamos no imaginar tanto e tanto maior,
Mesmo quando éramos tão e tão pequeninos,
Os pedaços que éramos também eram no beija-flor
E passavam por nós e pela aragem aos bocadinhos,

Silentes e pelo silêncio em tal alarido estapafúrdio
Além do que era, era o beijo de semente a semente,
Em nossos bocadinhos deste nada e naquele tudo
O que nele era, tanto e tanto ainda era no ausente,

Do coração enfim a parar, o saber não conseguir estar
Passava tudo, passava tudo, passava tudo e nada era
Como eu naquele momento e no seu instante ao luar…

Como o Sol eu a perseguia… tal como eles, eu à espera,
Ter esses instantes, altos e belos nesta parede a ornar
O mais do que tudo aquilo que ali parecia... oh quem dera!

As Suas Flores: Eram a Gota do Tempo

As suas flores eram as minhas horas
A gota num imenso oceano de sede
Onde os segundos esperavam auroras
Então encurraladas no quadro da parede,

E eras a água pelos desertos esfaimados
Onde jaziam os desejos feitos de tudo,
Para tocá-los faltavam beijos e bocados
Dos fragmentos feitos deste olhar mudo,

E o passar não passava obstinadamente
Então nada mais passava ou era passagem
Para além do que era para lá da mente,

Era assim o tempo em porção de aragem
Onde o sonho esquecia meu nome finalmente
Aonde suas flores eram estes beijos à viagem.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Eu, Tal Orfeu Pt. II: Deslembrámos As Três Palavras

Três palavras que completem esta trova
Que concedam descanso a esta insana lida,
Que sejam a terna almofada, manta e alcova
Que soem ao retorno ao lar, à costa querida,

Aqui não tem sido a Vida ou a Morte a pulsar
Tem sido o meio-termo de vista semicerrada,
De punhos fechados que esqueceram o abraçar
Da eternidade imensa do sonho na vista almejada,

Que eternidade terá então o instante esvoejante?
Tudo parece ósculo de colibri à chuva e ao sol
Encurralados por garrafas donde bebe o viandante,

Azuis, tal como as três palavras que ainda aguarda
De dedos esticados e braços abertos à luz do farol
Pois da névoa para ele... elas são o seu tudo... o seu nada.

sábado, 6 de abril de 2013

Eu, Tal Orfeu: Após Eurídice

Há segredos que nem as paredes devem saber,
As esquinas já os conhecem e já os esqueceram,
Há becos e cantos cuja passagem é o perder
Dos passos atrás dados e o que estes souberam,

Era ela, sempre à distância de um longo suspiro,
Beleza em frágeis delicadezas adiante projectadas,
Para lá dos degraus aonde suave e lentamente espiro,
Algures… as suas pestanas por estas eram beijadas,

Agora são esqueletos no armário e monstros sob a cama
Daquele cujos lábios amontoam fracções de constelações
Ora tornadas na aventesma que este nome ainda chama,

Frágil e delicadamente ecoa e ecoa numa suave lentidão,
De olhos bem fechados passam não passando as estações
Pois o tempo não é tempo aquando da bradicardia do coração.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

… e o Mundo Parou e Disse: Viandante És o Espaço

“Viandante tanto e tanto tens viandado
Que já nem sabes o que é estar como eu,
Tanto riso e pranto aqui tens partilhado
Que do que tens dado ignoras o que é teu,

Indiscretos, serão imensos os pequenos nadas
Erigindo um castelo que rascunhe partes do céu,
Serás ainda a saudade nas ocasiões não passadas
E o tempo escondido na tribuna de quem é o réu

Entre e onde a terra se mistura com o firmamento
Sendo o horizonte que a todos toca e a nenhum chega,
A aparente linha que se divide a cada novo momento

Onde o tempo passa parado, aguardando por nós,
Sem tirar ou dar pois somente o partilhar sossega
O espaço maior que o imenso e que dele é a voz.”

Aos Amadores: Esses Poetas Disfarçados

Não ao Amor de acordo pré-nupcial esterilizado
Feito reciclável e cómodo para sacos de plástico,
Aquele que à meia-vida é o reboque ou vem atrelado
Pois não é Vida nem é Morte, não é o ser no fantástico!

Pretendo apenas daqueles amores loucos e impossíveis,
Daqueles mesmos enfermos que saibam à doença
Que torna os ligeiros contos em factos indiscutíveis
Pois um dia ao olhar para trás serão a única pertença,

Torturado morrerei por cada beijo a rosas deixadas para trás
Somente assim saberei o quão curta e bela é esta Vida,
Os veteranos da Guerra das Flores raramente terão paz,
Porém almejá-la-ei com o peito todo fazendo-a sentida,

Ao longe vejo as pessoinhas de batas e luvas brancas ao peito
E sinto honra de ser pelo tão obviamente ridículo e patético,
Sem utilizar diminutivos para a Vida em fôlego rarefeito
Ou vulgarizando o coração de namorico em penico,

Outros riem-se de dedos apontados às próprias costas,
Não sabendo que desta maldição sou o abençoado
Pois à passagem das ruas, dos vales e das encostas
Do trilho esta é a única coisa que o torna digno de ser pisado.