quarta-feira, 31 de março de 2021

Quando Chegar a Hora

Para além do outro lado, fechando com dedos cautelosos
Nossos olhos de melancolia pela bruma surpreendidos, 
São estes os últimos dias do verão, estes ventos dolosos
Permanecem nas margens por choros ainda preenchidos,

O céu de cristal silenciosamente suplica por novos horizontes,
Nossos destinos entrelaçados falam de visões ainda por vir,
Campos dourados regozijam nos toques com sede de mil fontes,
Um estalido de faísca de ouro, fagulha nos peitos ainda por sentir, 

Beleza, querida teia de estrelas aproximando-se da abóboda, 
Labirinto do tempo, meu agora e para sempre nesta solidão, 
Cruzemos então a vida e a morte, uma alma na eterna roda, 

Aquela que é Deus para um infinito número de caras e rostos, 
Tempo, a divindade, Eu vim e tomei estas terras celestiais na mão
E agora que a noite me leva, tal pegada na areia, ofereço meus gestos.


sexta-feira, 26 de março de 2021

O Bosque Pelo Mar Sem Margem

Olhamos para dentro buscando a auréola exterior, 
Era eu, o homem de mãos à cintura, a bravura,
De quem esperava o amanhecer do dia anterior, 
Precisando de ébano e marfim, de simples alvura, 

Pois há bosques adiante de luzes fragmentadas, 
Os celestiais livres de tristezas da substância,
Doces sítios para movimentos e emboscadas
Quando, para lá da vista, ainda há relevância, 

Para lá das barreiras que limitam esta existência, 
Um dia, adiante, serei para lá dessa dimensão, 
Abraçando Rainhas e Reis em toda a sua iminência, 

Os céus cairão a meus pés, passado e presente,
Como um recém nascido de coração na mão, 
Este é o momento em que nos tornámos crente!

quarta-feira, 24 de março de 2021

Tanto Quanto Os Meus Olhos Conseguem Ver

Tanto quanto os meus olhos conseguem ver
Há sombras próximas, as portas sendo abertas, 
E eu, velho e sábio, não consigo ir ou me conter
À pergunta: "Será breve o passar das horas incertas?"

E tanto quanto os meus olhos conseguem ver, 
Os ventos de Outono trarão o Domingo, o vento, 
Quando for velho e sábio e no caminho for e correr, 
Um dia qualquer, no meio do tempo, ainda lamento, 

"Já foste meu amigo não foste?" - caem os confetes,
Saúda-me meu velho amigo, esqueci-me das pontes, 
Fecho os olhos, cerro o coração, não me inquietes, 

Poeira na brisa, uma gota de água num mar infinito,
Desconhecendo o que poderá vir depois ou dantes, 
Eu sou o aprendiz dos mestres, o eterno incógnito. 

As Palavras Que Saem Do Coração

Sei que as palavras são cegas e vagabundas,
Trilham na vaidade, no velório da impaciência,
São veículo para o longínquo, roda das rotundas, 
Porém o instante dita-me sobre sua transcendência, 

Prematura ou inesperada, deixai-me ir à procura,
Vestidos brancos, uma tela de tintas ainda fresca, 
Atracções onde nos vemos, a pele é tal brancura
Silhueta para a perfeição e a paisagem é pitoresca, 

Onde me perco vezes sem conta nos seus cabelos, 
Os dias poesia para uma noite repleta de estrelas,
A maré sobe, movemo-nos num sonho dos belos, 

Aqueles que nos antecedem, que abrem caminho, 
As palavras juntam-se em moções de aguarelas,
Pouco mais tenho a oferecer, só este bocadinho. 

terça-feira, 16 de março de 2021

A Infinda Vestimenta

Vou caminhando sozinho, em busca do perene itinerário,
Nunca tive os pés sobre a terra, desta terra quase falto,
Preferia ser um pássaro, vendo o mundo ao contrário,
Talvez fosse tudo mais belo visto do alto, lá do alto…

Outrora era astro indómito navegando o firmamento, 
A fagulha então luzente, a estória ainda por acontecer,
Aprendiz para o Inteiro, trazendo nos bolsos o sentimento
Que alumia o Céu e que não se permite em bolsos conter,

Doces brisas no topo das árvores, limpai-me o rosto,
Tenho esperado por séculos o regresso ao alvorecer
Guardá-lo-ei em garrafas para perdurar pelo sol-posto,

Apregoando amor perante o vendaval, perante a tormenta!
E o que restar guardarei nas algibeiras até poder oferecer,
Sim, as constelações terei um dia como infinda vestimenta.

segunda-feira, 15 de março de 2021

A Espera Continua

Vou seguindo o pássaro negro para casa, o lugar
Que apelido é onde descanso os ossos enfim, 
Pressiono a cara contra a vidraça da sala de estar,
Toco na janela e abro a porta, espero-a em nosso jardim,

Pois sei que Deus espera por mim no final do trilhado,
Não receio a morte nem a bruma que um dia virá,
Caminho procurando a libertação do coração algemado.
Procuro o Inteiro, desejo o prometido e pretendo-o já!

Quanto a quem amei um dia, sempre haverá espaço,
Para a ver quente e feliz, haja chuva ou faça Sol, 
Suspiro este desabafo nas nuvens ansiando seu regaço,

Os castelos de areia feitos no ar, tão difíceis de fazer,
Tão bonitos de ver, são apenas emboscada e anzol,
Miragem e ilusão para um peito casto satisfazer.


A Candeia Entre a Neblina

Algures entre este sol desponta o horizonte, 
De olhos perdidos para o poema, para a Vida, 
Translúcido, procurando sementes para a fonte
Que sacia a sede do sedento na ocasião envolvida,

Algures anoitece, a frialdade do ar queima o rosto,
O dano de um beijo e o ser colocado num cinzeiro,
Porém agitam-se os ramos e por instantes não há desgosto,
Para além de um manto de penumbra acossando o luzeiro, 

É o esplendor que separa o trigo do joio, o insigne amor, 
Descendo os corrimões que vão para Tártaro, à perdição!
Quase ouço os sopros, imponentes e repletos de clamor,

Antes que sucumba sobre mim a noite escura, a última cortina,
Percorrerei a terra, para sempre buscando o fragmento do coração,
Nesse preciso momento serei Deus a alumiar envolvido por neblina.

sábado, 13 de março de 2021

Este Quase Talvez

Olhos mexendo sob lágrimas azuladas, 
Este sonhar por vezes não é sustentável, 
Crava-se na pele e nas marés atracadas,
O tempo retoca e passa, isso é indubitável, 

Imobilizado e vestido em baldes de cimento,
Agarrando nuvens tentando obter o horizonte,
Onde o passo logo é passada e incremento
Para o viandante, o ir para lá desta ponte,

Porém ainda se perguntavam para onde foi o verão
E a beleza das transparências de corda ao pescoço
Apoquenta a graça, remedeia o ponto do cidadão,

Perdido e encontrado assim por uma última vez,
Sendo tão difícil de engolir, sendo tão insosso, 
Esta pedra que trago na garganta, este quase talvez.

sábado, 6 de março de 2021

Acordando Desperto

Acordando desperto procurando o brilhante
Do estelar, a incerteza de um olhar objectivo
Aí jaz então a beleza encontrada no instante, 
Desde o detalhe do abraço ao beijo respectivo,

Reflicto no passado, é vê-lo ao comprido estirado,
Foi a lágrima e o sorriso, foi o deixado e pretendido,
Onde a mudança foi permanente e é o único guardado
No baú deste coração ornamentado o então difundido, 

Os fragmentos que ligo são holofote para meninos perdidos,
Para sempre caindo magoando o joelho, arco-íris vendendo, 
Fugindo atrás do Sol, por um momento no tempo concedidos

Ao prazer de não ver as sombras no ir indo sobre o horizonte, 
Sobre a linha do céu, somente tu e eu, o infinito querendo
Quem trouxer ao passar do segundo, ao passar pela ponte.

terça-feira, 2 de março de 2021

Lágrima ao Mar

Não temais marinheiros, entrai bravios no mar,
Ante a próxima intempérie, o sonho inacabado,
Procurando a palavra, retorquindo deste lugar,
O osso do inteiro outrora então fragmentado,

Não temais exploradores, apostai na revinda, 
Sorri ao inalcançável, somos brisas e perdição, 
Os restantes dias passados donde a luz finda
Dos bastidores e uma cortina fecha o coração,

Escondemos os tesouros tão fundo sob a terra, 
Gritos entre segredos ocultos e lábios cerrados,
O mundo por vezes é aquilo que nos encerra 

Dentro do sol, sufocando e mendigando ar, 
Contando as sombras dos dias já rasurados, 
Com o tempo na lágrima, a lágrima no mar.