segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Quando Chega A Hora De Partir

Sustendo o fôlego de instantes outrora eclipsados,
Hoje pincelo a abóboda de cores jamais imaginadas,
Vou sacudindo a alma de pesadelos ontem sonhados,
Despindo lentamente as paredes entre si confinadas,

Acredito que suspiros são sorrisos ainda não vividos,
Pronuncio o passado, ansiando o futuro, absorto,
Rachando o chão por caminhos sinuosos e perdidos, 
Pulsando o ventre, frio e quente, erecto e até torto,

Entretanto aprendo: “Não há mais tempo para despedidas”
Pois o coração também pára na noite eterna e passageira, 
Prisioneiro do frio derrelicto, feito a dois por sendas divididas,

Somos roupas usadas recriando sombras em lúgubres recantos,
Sombras essas que vão dançando ao vento na luz forasteira, 
Trago os vultos que fomos indo, o pouco deixado e os tantos.

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Beija-me o Coração

Quero da água que brota da fonte distante,
Trouxe-te dentes de leão presos numa linha,
Lágrimas sorridas de um momento confortante
De um canção só tida no que um beijo sublinha, 

Esperamos primaveras e flores de pétalas tão belas,
De outros amores, de amores por ontem esquecidos, 
E eu quero chorar, aprender a contigo ser sob as velas
Dos instantes vertidos entre os dedos e que são perdidos, 

Tal palavras trocadas entre estranhos, então prisioneiros
Por mãos envolvidas por ervas, por eras, por esta solidão
Que comove os cigarros do chão, os secos entre aguaceiros,

E é enfim bonito ser feio nos braços dos outros, na multidão,
Pouco é regra e tudo termina no fôlego de outros, de terceiros,
Quando estivermos sozinhos num instante, por favor… beija-me o coração. 




sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

Andar Para Trás

Tento andar para trás num belíssimo despiste,
Revelando os passos outrora e entretanto dados,
Pois por onde já fui vou ora de arma em riste,
Enfeitiçado pelos tratados de outros passados,

Aqui, abaixo da abóbada celeste tenho lugar
Para um dia retornar, em caves procriado,
Abaixo do diálogo do soalho, num estranho andar,
Prevalecido sobre os estilhaços do caminhado,

Esta camisa de forças é a porta das insanidades,
Quisesse eu retalhos de mim, iria de novo atrás,
Não ficaria entre as crianças e o velho das idades,

Procurar-me-ia entre o gelo e o carvão das horas más,
No momento em que a lembrança eram as saudades,
No que o vento do norte vai levando e por fim trás.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

Só Pretendo A Eternidade

Há lugarejos através de recantos de escuridão,
Onde o poema vai perdido sem o seu segundo,
E eu, viandante das estrelas envolto em solidão,
Vou procurando meu lugar, minha parte do mundo,

Renasço em poesia quando o fruto do amor invade
As muralhas que ergui perante a sombra que resfria,
Sabei que com o horizonte ainda sinto cumplicidade,
Um dia hei-de o passar brioso e altivo em grande euforia,

Trago raios de sol nestes meus braços que vou embalando,
Resplandecem a esperança de um outro dia, outra manhã,
Por cada esquina transvasada, verto-me em água, cantando, 

O hino dos poetas que me precedem, dos deuses lá do alto!
Acordando para mim mesmo, vem lentamente outro amanhã,
Farei desse momento eterno por cada passo dado neste asfalto.


domingo, 5 de fevereiro de 2023

O Boato (Cerebral)

Tenho gritos de guerra na garganta ainda hoje plantados,
São poiso para asas engarrafadas em navios sem destino,
Filhotes de heróis mortos cujos corpos nunca procurados
São eu, orfandade e lágrimas, as moradias sem inquilino,

E é desespero, vontade do não anseio, o suspiro perdido,
E eu vencido antes de ser derrotado, sem qualquer perdão,
A pluma na faca aguçada, um nome sem qualquer apelido,
Aprendi a morrer enquanto sou vivo de algemado coração,

Ela pavoneia-se entre as estrelas, sem qualquer amor para dar,
E cada letra, cada palavra é sentença para de mim recuar,
É o solavanco na estrada, a direcção alterada, o inebriar palato

Indiscreto, esvaecendo tal vinho entre dedos descalços, insensato
Sou eu, é o bocadinho da dúvida, o não conseguir comigo relacionar
O fragmento em que somos vida, em que não somos apenas o boato.