domingo, 31 de maio de 2015

O Fardo de Quem Não Tem Peso

O fardo de quem não tem peso
E vai deambulando pelos dias
Sob o céu aberto sente-se preso
É vê-lo em mil e uma correrias,

Outro dia e outro horizonte perdido,
Ouçam o covarde de porta aberta,
Perde-se a hora, perde-se o sentido
Que quando o mundo passa tal oferta

O caminhante se recusa a caminhar,
Quase não há restos de bela magia
E até sítios onde se podia encontrar

Música de fundo perdeu sua melodia,
Quase não se ouve o mundo a passar
Na loucura que é o mundano dia a dia.

sábado, 30 de maio de 2015

O Tiquetaque da Hora Má

A sua voz é a possível proximidade,
O silêncio caiado pela sua presença,
Por cada palavra deixada vem a saudade
Que é largada ao esmo da indiferença,

A queda do coração é dia comum,
O cansaço de quem tanto aguarda
Os instantes em que me sinto mais um
Esquecem os bons tempos da retaguarda,

Venha a chegada seja aonde quer que seja
Desde que o dia surja e a noite se vá,
Quem dera ainda ter a luz que beija

Os contornos de quem se deixa por cá
E ao não ser o mundo todo inveja
Pelo tiquetaque da hora má...

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Uma Lágrima

Uma lágrima por todos os dias idos,
Aqueles dias em que dormi sem sono,
Aquém do horizonte jazem escondidos,
Aquém de mim são todo o meu abandono,

Uma lágrima aos dias que serão esquecidos,
Por serem pouco, por serem quase nada,
Por não chegarem a ser pois foram perdidos
Precisamente quando os colocava à alçada

De um tempo que nunca em si teve tempo,
Uma lágrima para quem não teve coragem
Pois ao ir, não foi na brisa quedou-se o alento

E do ar quentinho ficou apenas uma friagem
Ficando sem nunca ser, sendo tom de cinzento,
Caminhando o caminho sem nunca ser viagem.

Este Tempo é Cansaço

Este tempo de que sou passageiro,
Este tempo que é todo o meu cansaço,
Parece vida atirada para o bueiro,
Que soa a não vida em tudo que faço,

Do tido como maior ao mais pequeno,
Meados num silêncio feito de sono,
É olhar cerrado num gesto obsceno,
Toda a queda de uma folha ao outono,

Mãe é o teu filho que chora ao vento,
Neste cansaço feito de porções de nada,
Que é tão calado e faz-se tão barulhento

E vai deixando a alma abandonada
Pois é tanto e tanto e tanto o desalento
Que mal sinto as indentações da almofada

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Não Chega O Tempo Que Tenho

Já não me chega o tempo que tenho
Preciso de algum tempo emprestado,
Pois é neste meio ir que contenho
Todo o tempo que parece parado,

Preciso de tempo para as horas mortas
Para as ir enchendo de entulho,
É assim que pelas pontes tortas
As vou ocupando de barulho,

Assim que passam silenciosos segundos
Pela estrada que é sempre partida,
É assim que vêm e vão mundos

Preenchendo o tempo que é a vida
Onde quem não tem tempo é moribundo
Quando o tempo em si não tem saída.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

No Palco Que Vejo

No palco que vejo já não há lugar,
Lugar nem tão pouco há na plateia,
Estes tempos têm sido o deixar andar,
Só ficando uma mão cheia de areia

Que não é de quem se vê como actor
Nem tão pouco o é mero observante
É espaço não ocupado, pungente dor,
De quem não vê bem o futuro adiante,

Passam os dias parecendo noites idas
De discurso tido em silêncio calado,
Não é assim que se passam mil vidas,

Não é assim que virá a ele o destinado,
Parece só ficar um molho de dúvidas,
Parece apenas surgir o não ansiado.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Quando me For

Quando me for, dedicas-me uma elegia?
Daquelas mais antigas que o tempo em si,
Que ela traga do sonho um pouco de magia,
Que me lembre das centelhas que já prometi,

Quando me for, fazes de conta que te lembras?
Não me importo que vá ou que seja a partida,
Espero deixar algo por cá para além de sombras
Espero promover Amor sem alguma contrapartida,

Quando me for, não chorem sobre o meu caixão,
Sorrirei de sorriso aberto ante o trilho incerto,
De orelha sobre o firmamento ouvireis meu coração,

No silêncio de uma sala, esquecei esta passagem,
Apesar de totalmente imóvel estarei bem desperto
Quando deixar a terra e retomar a derradeira viagem.

Um Barquito e Um Trenó Cruzaram-se

Um barco amarelo sob um céu azul
Acenando adiante onde havia maré,
O barquito tocava as margens e a sul
Ágil ele se remetia com toda a sua fé,

Um trenó ia sobre neves esbranquiçadas
Sorrindo em frente onde havia curvas,
Lá ia ele por sendas nunca trilhadas
Por trilhos inexplorados e águas turvas,

Eis que enfim o mundo se tinha retirado,
O céu era mais azul, a neve mais branca,
Havia pássaros no ar e este era reciclado,

Um barco se cruzava com um pequeno trenó
Ao que um jovial verão ao inverno encanta
E tudo vinha e se ia, ao acordar de um ó-ó.

Esperamos Aqui

Esperamos aqui, face ao precipício do mundo,
Silenciosos de mão na alma e alma no coração,
Sendo os trapos dos farrapos e o pé do vagabundo
Aquele pequeno pedaço que almejo não ser em vão,

Esperamos aqui, de frente para o que já passou,
Mudos e silentes onde perdemos o nosso irmão,
Independentemente de quanto ele já amou,
Saibam! Era por ele que ainda sentia ter chão

Para caminhar além do horizonte, além de nós,
Mesmo quando longe parecia ele ainda chegar
Sem temor erguia-se o homem, erguia-se a voz

Para logo adormecer num cansaço reticente,
Esperamos aqui, por prometido bem-estar
Podia ele ser homem mesmo que inocente?