terça-feira, 25 de setembro de 2018

Aquele Lugar Em Mim

Sinto anjos na língua arrebatando-me para cima,
Abraçam-me enquanto dormito, envolve-me o beijo,
E logo deixamos o terrestre, somos obra-prima,
O resto passa em silêncio, sem gesto ou desejo,

Frios e quentes, sou nu, sou a última despedida,
Que importa o vindouro? Morri antes de nascer
Pois nada importa e eu sou tudo, a bem-vinda
Parte que quase falta, que não pára de acontecer,

Logo impludo em possibilidades, expugnado,
Procurando sem descanso aquele lugar em mim, 
Deixai-me voltar sem duvidar do coração quebrado,

Passar pelo tempo traçando percursos sem fim,
Sou culpado por todos estes segundos ter amado
E a sentença é viver que nem um danado, ámen, plim!

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Beija-me Os Lábios

Beija-me os lábios e sente esta enxurrada,
Traz-me à vida, reavive este meu coração,
Pois por vezes quando vai o pé à estrada
Esquecemos o quão este trilho é benção,

Beija-me os lábios e amortece esta queda,
A morte é transeunte no passo trilhado,
Olvida o ontem que outrora era alameda
Hoje é o presente que se torna passado,

Beija-me os lábios e enfim faz-me feliz,
A felicidade é passageira na nebulosa,
Ergue tal manancial o pequeno petiz

Apesar de um beijo ser apenas um beijo
Ele tem a energia e a força miraculosa
De se tornar no poeta em seu almejo.

sábado, 15 de setembro de 2018

De Sorriso Ladeado Com O Esquecimento

Atrás do sorriso de menino de pés descalços,
Há estrelas e nebulosas para quem ousa sonhar,
Mesmo vindo a morte e a bruma e seus percalços
É preciso urgentemente permitir ser e aí então amar

Com o coração de mil supernovas, ser a explosão,
A brisa e a tempestade, o último catalisador
E então haverá paz, serenidade e enfim a solidão
Do homem tornado velho tendo em si todo o amor

Que é deste mundo, que é de quem partiu há instantes,
Somos vagabundos sem pertença, somos párias
De uma época há muito partida, agora  distantes

De quem nos deu a mão e nos trouxe ao caminho,
Foste tu amor, a saudade de um passado, uma ária
À ausência de futuro, morrerei um dia sozinho.

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Quando Viver é Morrer Um Pouco Mais No Caminho

Nesta montanha-russa, a noite é o único guia,
Beber até acreditar no impossível, beijos molhados
Por chagas e chamas, desejos sujos e perde-se o dia,
Tenho Deus e o Diabo ambos no peito cravados,

Acredito neste doce sofrimento, vim para a doença,
Esta crosta pungente de sentimentos perdidos,
Autoproclamo-me de maior que a vida e a sentença
É quando vem a morte e nos damos por vencidos

Afónicos, por favor, oferecei-me o esquecimento,
Andemos sobre a água e afoguemo-nos mais além,
Percebeis agora toda a minha tristeza, este lamento?

Não há maneira de ir em frente, penso no nada,
Juro e prometo, rogo e suplico, somos sozinhos e sem
Casa procuramos lugar entre os cantos vis da estrada!

domingo, 9 de setembro de 2018

A Leveza Insustentável do Horizonte

Nascendo do sonho e morrendo na sepultura,
Entre o nada e o nada há uma vida inteira,
Partindo e amando com o fogo que dura
E doura, tudo o resto é somente canseira,

Sorriso para o cerúleo de coração quebrado,
Todos os segundos enfim passados são ponte
Para o momento justamente agora eclipsado
Macerado pela leveza insustentável do horizonte,

Tirando as pétalas que vão adornando o caminho,
Aceno em despedida aos rostos então adjacentes,
Chama-me o vento, sussurra-me a brisa, e sozinho

Vou indo por onde a bruma é senhora e rainha,
Enquanto o destino vem-me cerrando os dentes,
Afastado do sol sou eu a indubitável sombra sozinha.

quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Trocando Sonhos Por Copos

Um copo de silêncio, descanso para quem escuta,
Agora já sabes que estou no barco dos perdidos,
Entre o gelo e as dunas, é a vida que aqui nos enluta,
Mal chegamos ao objectivo e já estamos vencidos,

Vejo o tempo enrugado a beijar-me levemente o rosto
E eu procurando no escuro por uma lamparina
Que alumie o vazio de um coração e seu desgosto,
Assim troco sonhos por copos, eu sou a neblina,

O farol e o nevoeiro, a viagem sozinha e o companheiro,
Frio sob estes lençóis feitos de pedaços de lembranças,
Respirando ofegante sei que sou meio, quase inteiro

Mesmo na falta, na carência, na fraqueza das pernas,
Perguntando como é possível ser o velho e as crianças
Assim passo o tempo sem o passar por estas horas eternas.