quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Cicatrizes Duradouras

Entre as margens e marés, a insegurança da respiração,
É a razão para a cedência, para a gaiola da debutante,
Este fado da não pertença é um cântico para a desilusão,
Os murmúrios entre dentes rangidos, venha o restante,

Pois anseio por beijos eternos apesar da sua efemeridade,
O desgaste da alma, os sonhos enterrados em vala comum,
É esta imanência que condena o vulto desta nebulosidade
Preenche de cicatrizes estas feridas delicadas, sou mais um,

Vamos indo no trilho, almejando a chegada, sem ser em partida,
Não percebes que fui capturado pelas linhas dessa beldade,
Entendei que entre essas margens e marés fiz toda uma vida,

Esta odisseia melancólica provém de um coração quebrado,
A natureza reflectiva do poema é indelével em curiosidade,
Então quando morrer, enviem flores bonitas ao meu cuidado.

Voo Interrompido

Linhas definidas nas plumas destas asas quebradas,
Por onde outrora esvoaçamos vou e latejo ofegante
Por onde vamos percorro com veias ensanguentadas,
Estado de mente onde nem sequer basta o bastante,

Olhar cansado, alma conturbada, falta-me o restante,
Escavado o buraco onde fiz ninho com estas unhas,
Estas paredes tornam-se numa cinza gaiola do adiante,
Delicadas feridas são as trazidas ao olhar das testemunhas

Que me vão apontando o dedo, acenando a mão ao caixão,
Uma vida ligada a um fado não nosso, vai-se o sonhado,
A não pertença é a sentença desta ânsia e preocupação,

O que me carece, o que me escasseia para além do almejado,
A droga da esperança, a agulha da crença bate no coração
E eu, entre margens, sou deixado à maré e o seu cuidado.

segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Há Que Partir Para Conseguir Chegar

Se ela visse os pássaros azuis neste olhar trazidos,
A boca aberta onde caem as gotas de água matutinas, 
A respiração ofegante por estes poemas imbuídos,
Este sorriso mantido somente pelas horas libertinas, 

Os seus cachos de cabelo pelos ombros colhidos, 
É diferente, assim de repente, o ver entre as cortinas,
Ela é toda a beleza que me vai agravando os sentidos, 
Ela é fado, destino, e chegada derramada nestas páginas, 

Pois se um dia não for partida e enfim conhecer a morte, 
Terei tido na palma da mão a sua, dar-me-ei por contente, 
O prisioneiro de si então por fim rendido à sua própria sorte, 

Não sou estranho à preocupação, à subtileza do apelo do caixão, 
Contudo ainda há potenciais caminhos para ir em frente, 
Há que colocar em prática o aprendido pelo coração. 

terça-feira, 21 de novembro de 2023

Primavera dos Sentidos

Numa moldura escrevemos o som de uma canção,
Em papel pintado a esdrúxulas, num doce suspiro,
Entrelaçados, o seu corpo, os meus braços, um coração,
E vem a aurora, ofegantes nos damos em apartado retiro,

Vestígios de perfume por um beijo encantado deixados,
É o labirinto inefável de um silêncio que vai perdurando,
Resplandecente, no olhar brilhante por uma brisa afagados,
Há flores no seu sorriso e por onde formos enfim caminhando,

Encanto, calma e harmonia, para trás vai ficando a preocupação,
É um reflexo de refractado, é equivocado é comboio sem estação,
Anseio a silhueta que é sombra e vulto na noite e sua passagem,

Chegada enfim e finalmente a terna primavera e a sua paisagem,
Nunca esquecerei de que há vislumbres de nós em nossos lugares,
Divagados ao esmo da poesia, debaixo do Sol e dos nossos madrugares.

terça-feira, 14 de novembro de 2023

Aprendizes na Arte do Amor

Circundo a noite de outrora com as luzes apagadas,
Vem a poeira de um tapete persa dentro dos pulmões,
Dentro deles o mar move-se por entre terras onduladas
Onde sou esquecimento sem culpa de mil e um apagões,

Este olhar brilhante repleto de estrelas esvai o firmamento,
Procuro um novo dia sob a forma da mão que traga a eternidade,
Da escuridão estou ofegante, passa-me a voracidade do momento,
E ela assim respira profundamente numa terna e sublime beldade,

E casa não é sinónimo de lar, por isso fantasmas se deitam nesta cama,
Há alívio perante o espaço que não é meu, milhões de pontos reluzentes,
Onde eu já fui adjacente ao instante que se instalava ao lado desta lama,

Insónias e ausência de sonhos não pode ser existência para o trovador,
Porque tenho uma certeza, este Amor é a outros tempos pertencentes,
Consequente esta é a verdade, em cada um de nós existe um amador.

quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Parece

Parece que levemente a palavra da página foi virada,
Não regressou enfim aquele beijo outrora retornado,
E eu fiquei triste e apeado no meio da cinza estrada,
Sem sítio para ir ou ficar, tão perdido e transtornado,

Parece que lentamente foi o dom da expressão escondido,
Num momento lúgubre detido pela falta de um coração,
Encalhado na nostalgia do passado, a quimera ferida
É sonho sonhado feito de estrelas, feito de oração,

Parece que sou homem realizado somente por metade,
De garganta seca com sede por um tempo sempre vindoiro
Que aparenta não vir e que despoleta toda esta saudade,

Parece que o comboio veio e já foi, e eu nem na estação,
Sem chegada ou partida, neste caixão acabado em oiro,
Eu sou só mais um poeta, esta é a minha bênção e maldição.

terça-feira, 7 de novembro de 2023

Infinita Monção

Preenchidas algibeiras de ossos recheados de nada,
Não voltaremos aquele singelo sítio chamado de lar, 
Sustemos o fôlego por um momento sem chegada,
Dizemos obrigada e regressamos ao não lugar, 

Pois já fomos passageiros do comboio sem vagões, 
Levanto o braço e não sinto entre ele a brisa, 
São as meninas bonitas que escavam os mais belos caixões,
E costuma ser o poeta que se perde aonde pisa,

Precisamos de balanço, ainda estamos longe da distância, 
O quebranto da água a bater no soalho é apelido
Da lágrima estalada, da madrugada e da sua instância,

Próximo do fim, sem ver a eternidade, parte-me o coração,
De dedos cruzados, esqueci das estrelas que havia vestido, 
Somente há funis sem fundo, assim vem a infinita monção. 

sexta-feira, 3 de novembro de 2023

Melancolia Outonal

Estes passeios repletos de folhas caídas em noites contadas,
Devagar inundam as artérias inóspitas, as ruelas sem lugar,
Parecem mais longas do que são, contêm outras passadas,
E sobre a terra húmida sinto-a a descer, quase a solavancar,

É a melancolia própria do Outono, de uma quase não estação,
Entre lábios murmúrios de palavras há muito tempo silentes,
Onde nos perdemos dentre o trilho, perdemos o nosso vagão,
E nos preenchemos em restos de chuva num abraço latente,

Embalo a enxurrada como se ela fosse uma filha, um familiar,
E parece nunca acabar, mesmo quando a pouso neste chão,
A sombra que vem e vai da qual pareço não conseguir escapar,

O espaço que vai daqui ao horizonte, o pulsar deste coração,
Que bate, como não, a dançar e com o aguaceiro a se enrolar
Basta-me ficar, só mais um instante e estarei pronto para o caixão.

quinta-feira, 2 de novembro de 2023

Jornada do Homem em Busca de Si Mesmo

Quando vier a tarde e cair a noite, vou-me embora,
Para um sítio solitário para onde vão os perdidos,
Independentemente do momento ou sequer da hora,
Abrirei um sepulcro para sepultar os em batalha feridos,

Quem haverá que me defenda ou, em boa fé, resguarde?
Num doce e gentil gesto de imaculada e delicada brancura,
Quando vier a tarde, quem haverá que no seu peito me guarde
Ou diga por belas palavras o quão foi muito nobre a aventura?

Pois por vezes perco a formosura, a vontade de ir e ser adiante,
O crente perde a crença, o olhar bem focado no seu horizonte,
Mesmo quando esse horizonte não aparenta ser tão distante,

Apesar do medo do escuro quando sol nem sequer é soalheiro,
Procuro a fé, procuro a força para, sem temer, passar a ponte,
Lá no fundo dói, e por dentro me rói, esta busca do homem inteiro!

Tão Longe, Tão Perto: O Lar do Coração

Incessante procuro o sítio a que possa chamar de lar,
E ela pode-me dar a mão, pode-me ensinar a amar,
Supondo que o tempo passa e não volta para trás,
Sabendo que por vezes é difícil passar por horas más,

E tenho saudades de tocar singelamente no seu rosto,
Andarmos de mão dada e no seu ombro sentir o recosto
De uma alma concedida a um amanhã ainda por ter vinda,
Relembro e celebro o seu semblante numa só moção ainda,

Mesmo quando não durmo e os maus pensamentos afloram,
O meu coração bate mais forte a pensar nela, a si se decoram,
Ensinam-me que podemos ser maiores do que o que existe na Vida,

Vejo-a e num frondoso retoque então sei que ela é a minha querida,
Por um sonho beijado que um dia espero que seja enfim realizado,
Trago-te na algibeira do peito, perto de mim e do que tenho sonhado.