terça-feira, 29 de maio de 2018

Enquanto Vamos Passando, Ouçam Nosso Passar

Sim, um dia morrerei, obrigado querida vida,
Entrega-me ao resto e permite-me o fragmento,
A pegada na estrada, o por fim fazê-la sentida
É ergue-la bem alto celebrando cada momento,

Tenho sido tantos, tantos por mim e no segundo, 
Chamam-me rua e por ela tenho sido a passagem,
Sempre sem destino de onde parti ainda sou oriundo
De tudo que passa pelo peito, essa é a única viagem,

Canto em qualquer canto, largando amor ao caminho,
Se um lindo dia partir e deixar a magia ser esquecida
Lembrem-se que ela está cá, acompanhado ou sozinho

E que somente depende da ponte para a margem querida,
Beijo a terra que piso, pele virá da cicatriz, e o escaninho
Para o Sol e Lua da algibeira contendo porções desta vida.

segunda-feira, 21 de maio de 2018

O Instante Sou Eu

Vou indo e recolho-me ao abrigo da tempestade,
Sou espaço para o olvido e o seu esquecimento
Destes lábios em súmula minha única verdade
Que é perdição para os achados e o acontecimento

É este perdão por quem não fui, aquele não ser,
O toque não tocado, a vontade deixada à maresia,
Os amores que partiram ainda são parte deste ver,
Os amores que partiram são toda esta poesia,

Não há escape à envoltura do beijo do passado,
Esperando a cada esquina por um instante
Que já partiu e chegará no tido como ansiado,

Amor, o resto somos nós de olhos bem fechados,
Por tudo que vem parece que não basta o bastante,
Nem destino, nem fado, nem os trilhos já passados.

domingo, 20 de maio de 2018

Dentro do Olho da Tempestade

Um barco a remos flutuando entre a multidão,
Perdido para este mundo, levando a certeza,
Algures entre o azul, procurando a estação
Onde faz sentido o ver um pouco de beleza,

Onde a brisa sopra fresca e o céu tímido começa,
Há instantes em que Deus fala, há a eternidade
Que por muito que venha e seja e até aconteça
Somente encontrará refúgio pela tempestade,

De onda em onda, faz-se da maré o marinheiro,
De vaga em vaga, sob a chuva e sobre o sol
Que venha o arco-íris deste terno aguaceiro,

Submersos e imersos no sonho alado tornado,
Somos sementes no lazúli escapando do anzol
Que é mar adentro, rapidito, o azul respirado.

domingo, 13 de maio de 2018

De Olhos Acordados

Sol, queima-me as pálpebras e permite-me ver,
Passam épocas num olhar que é emoldurado
Por quem vem se tornando passado, este ser
Só pretende leito e repouso, lugar recatado,

O vazio em mim é recusa para a última música cantada,
Promovo amor tal investimento, ah doce esquecimento,
Mal me lembro daquela palavra ainda não inventada,
Que era amor, era dor, era paragem e movimento,

Àqueles que trilham sob a chuva, um único beijo,
Larguem-me nas ruas, soletrando este apelido,
E percebei que quase não tem lugar este almejo,

Adormecerei ao ombro da Lua, aqui confessando
Os atalhos das vielas, o olhar de Ema, o prentendido,
Desvaneço em ar nesses nuances tal pluma esvoejando.

sexta-feira, 11 de maio de 2018

Nos Pássaros Azuis do Peito

Estou nas mãos do beijo, de uma alada fantasia,
De apelido cerúleo, voo enquanto ardem cidades,
Que venha o Apocalipse, sou detentor da melodia
Que separa peões de deuses, que ignora idades,

Despindo peles, sou camadas de ventos e brisas,
Encoberto pelo pássaro azul, acreditando no insano,
Respirando a liberdade de mil e um poetas e poetisas,
Sou anjo, sou coração aberto, vinda ano após ano,

Dou tudo, fico com mais, a fuga torna-se procura,
Até encontrar o segundo dourado e logo o deixar,
Deixem-me ir, permiti-me ficar no que foge e dura,

Sigo e caio entre os perdidos por vezes encontrado,
Onde todos somos belos, onde todos temos lugar
Pelo sujeito amar no estranho familiar sussurrado.

terça-feira, 8 de maio de 2018

A Crença é o Pavimento dos Sonhadores

A calçada é abrigo para os desalojados,
O caminho estrada para o beijo partido,
Somos evanescência dos já quebrados
O espaço entre o odiado e o querido,

Respiro fundo e lágrimas são no peito,
Amor um dia encontrar-te-ei no trilho,
Estas palavras sem qualquer despeito
Dizem sobre quem do elísio é filho,

E perdidos suspiramos a morte e a vida,
Entreabertos para o amanhã, o toque
É só o poema incompleto desta saída,

A crença é a apóstata e o apostolo aqui,
Ainda bem que por cá há quem troque
A cidade e a cinza pelo beijo do colibri.


segunda-feira, 7 de maio de 2018

A Ideia de Beijo Sem o Lábio Tocado

Água vai subindo enquanto o chão se quebra,
Estou de costas, flutuando sobre o infinito,
Olhando para o céu no que aqui se celebra
É a maré que me leva o silêncio e o grito,

Fujamos Amor, nada nos espera mais aqui,
Sem pertença além, afoga-te já comigo,
Se partires, quando for, encontra-me ali
Onde estrelas colidem sendo meu abrigo,

Corramos Amor que deixemos a água rasa
Nos beijar os pulmões tão delicadamente
Sem nada para dizer, esta paixão é brasa,

O lume consumir-nos-á enfim e certamente,
Este belo suicídio é só beijo e a ideia de casa
Que nunca chega aos lábios do homem ausente.


sexta-feira, 4 de maio de 2018

Este Beijo é o Meu Único Tesouro

O sol cobre-me o peito, sou um simples almejo,
Para além de onde estou, vem a revelação:
Anseio o para lá do horizonte, do que vejo
E entretanto esqueci no armário do coração,

Nas mãos de outros, estes olhos semi-cerrados,
O tempo perdido são estes trilhos percorridos,
Colapsando em camas desfeitas, enganados,
E nós dormindo entre lençóis meio rompidos,

Sentindo o seu respirar, um murmúrio sem apelido,
Estes cadáveres movendo-se perante o vindouro,
Somos as estrelas caídas em almofadas sem sentido

Os meninos dançando em berços feitos de ouro,
E eu sempre indo mas tão longe do pretendido,
Por favor compreendei, este beijo é o meu tesouro.

O Monstro Disfarçado de Princesa

Ser poeta - ainda não cheguei e já fui a partida,
Perdido entre a volúpia de um abraço involuntário,
Sou só qualquer ponte para aquela margem querida
Pois das suas cores favoritas eu sou o seu contrário,

A silhueta da sua voz é a distância presente no mundo,
Distrai a solidão, o ansiar estar é ir de mão em mão
Mesmo sabendo que para o sentir sou só poço profundo,
Esquecendo os lábios que nos beijaram, abate o coração!

Este toque é um vampiro cravando as garras no transeunte,
Abutre e lobo para o desprevenido, sem descanso ou sono,
Fugi, “o monstro disfarçado de princesa” há quem pergunte

Pois morreu em seu langor, no ventre do matricida, só poeira,
Sem qualquer culpa ou dor, no ponto sem presente ou retorno,
Perdido já estou eu, este é o último resto desta minha algibeira.

quinta-feira, 3 de maio de 2018

Por Prados e Planaltos

Recebido o partilhado é largado um obrigado,
Fecho os olhos e entreaberto torno-me janela,
A iris pálida, o pássaro negro, o prado sobrevoado
Até que ante nós apareça a mais bela estrela,

O poeta é de outros planetas, traz no coração a alma,
É suspiro no eterno, frágil e delicado tal Orfeu,
É o murmúrio no riacho que sossega e acalma,
O vendaval que é algures entre Nero e Romeu,

A procura é o que traz do horizonte tão distante,
É beijo aos segundos entretanto já caminhados,
E ele, aos bocados, é da fagulha o único amante,

Estirado por onde em passos outrora ecoados
Foi pluma de pássaros negros por paragem errante,
Chegou o seu tempo, esta é a hora do ansiado.