segunda-feira, 29 de outubro de 2018

Trago Sonhos Para Os Insones

Pé esvoaçante na estrada secundária, perdido,
Visando juramentos eternos, vagueando sozinho,
Preciso de sentir vida para me sentir vivido,
Há poeira nesta alma, há poeira no caminho,

Longe está o meu belo horizonte, o firmamento,
Procurando a busca, a arte do desencontro,
Pois o que é instante passa, é somente momento,
Dança e o mundo vira universo, esse reencontro

É tudo o que trago escondido neste coração,
Através dum véu nocturno acordo desperto,
Homens vejam, trago sonhos nesta mão

Para quem não dorme ou não os tem por perto,
E é assim que vou passando estação a estação
Com a certeza de antemão de que tudo é incerto.

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

Voltaremos a Brilhar

Luzes dependuradas das abóbodas celestes,
Invadimos o cerúleo, frágeis e tão delicados,
O pedaço do Sol erguendo-se enfim a oeste,
Aí vem a madrugada silente nestes bocados

Que são de quem não tem pertença, o beijo,
É céu repleto de estrelas, a imensidão é bela
Pois é rede para o sonhador e o seu almejo
Fica, fica connosco foge daquela escapadela,

Apesar de para já ser escuro e haver nevoeiro,
Um dia seremos as luzes que fomos um dia,
Teremos enfim um lar, por fim o verdadeiro!

Fica, fica connosco e sê novamente a magia
Daquele belo tempo iluminado pelo candeeiro
Que erguíamos pela mão afastando a melancolia.


terça-feira, 23 de outubro de 2018

Elegia do Filho do Sol ao Pai

Igual ao meu coração, jorra sangue pelo olhar
O ócio matou o sol, a nascença se há derramado
No filho do sol, enfim o abismo abrirá a cancela do ar
E o esqueleto moribundo do presente será passado,

Quem dera ouvir a sua voz com um abraço sentido,
Porém só há uma nuvem de fumo nesses pulmões,
Que me deixa a meio percurso e eu tão perdido,
Não há conforto para esse corpo nestes colchões,

Pai, lembro-me dum sorriso próprio somente teu,
Que não te esqueças de despertar, é hora de acordar,
Não te dissolvas numa memória de quem creu 

Que era só beijo para se afagar e permitir sonhar,
Apesar de ter nas pernas a eterna lira de Orfeu
Tenho um longo caminho para ainda mais me afastar.

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

O Poeta e a Prostituta

O poeta oferecia prados e céus num só almejo,
Ela neles corria sem tréguas, paixão ou desejo,
Ele conferia-lhe pérolas e no olhar a imensidão,
Ela engolia-as uma a uma sem amor ou perdão,

Ela era breu da noite, bruma e olhar bem cerrado,
Ele de tanto dar era só em seu brinde entornado,
Ela, tropelia em atropelamento sem sentir nada,
Ele com o coração ao vento e de vista tão ornada

Reparava que ela era partida, pela viela absolvida,
Sem querer saber de si, quanto mais desta poesia,
Era ele e ela numa estrada dentro de si já perdida,

Onde ambos deambulavam não indo mais em frente,
Assim escasseava o beijo, assim morria a magia
E enfim ele chorava e ela ocupada fodia toda a gente!

segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Para Quem Quiser Viajar Comigo

Eu era o grito de pés descalços no chão,
Deitado numa mesa, esbracejando só,
Querendo ir onde me levasse o coração,
Num círculo eterno coberto por este pó,

Que nos pulmões era um furor contagiante,
Em delírio enlousante, quase sem querer,
Ouçam o eco da sombra em mim distante,
O custo será o continuar a olhar sem ver

E não obstante, sentir as raízes em colapso,
As folhas na estrada estalando sob os pés,
Em meu olhar traçar-te-ia em fino traço,

Permite então que te mostre a verdadeira dor
Pois vamos e recuamos em marcha a rés,
Reconhece a minha doença - falta de amor.

quarta-feira, 10 de outubro de 2018

Beija-me e Sente o Universo

Beija-me e compreende as galáxias do firmamento,
Abraça-me e sente o calor de cem supernovas,
Este é o único instante, é o único momento
Para mostrar que em nosso peito batem trovas

Pertencentes aos poetas que nos antecederam,
A quem jorrou sangue por um puro sentimento,
Que foram joguetes todavia aqui aconteceram,
Este é o rosto do éter e este trilho seu testamento,

Cadente entre o cerúleo, o palpitar do coração
É magma escaldante, os mais leves passageiros,
Este é o descanso que vem com a nova estação

Solta as amarras e liberta os teus prisioneiros,
Vem para o vendaval, agarra-te e dá-me a mão,
Não é tempo para os náufragos, este tempo é dos inteiros.

sexta-feira, 5 de outubro de 2018

Sou Uma Nuvem

Sou uma nuvem passeando lá no céu adiante,
Ligeira e leve, tão próxima do sol e horizonte,
Navegando pelo vento ora perto ora distante
Para no final do arco-íris encontrar a ponte,

Por vezes sorrio, outras sei bem o que é lacrimejar,
Por onde a brisa me levar, sobre desertos e prados,
Há até alturas de onde ouço o coração quebrar,
Momentos soturnos por silêncio impregnados,

Procuro o que fui deixando pelo caminho
E que nele ainda não apareceu, oh Deus meu,
Por isso deixei o rebanho, por isso vou sozinho

Onde o sol nasce e a lua se põe, este é o fado,
Sou uma nuvem dando o beijo, aquele só teu,
Sim, amor é tudo o que nesta terra tenho deixado.

quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Procurando-a Tal Mariposa (Para O Candeeiro)

Procuramos o candeeiro quando se revela,
Abrimos então a janela esticando a corda
Pois quando pensar é somente pensar nela,
Até o mais sonolento sonhador enfim acorda,

Então confesso de joelhos o quanto a quero,
E do antro da estranheza não sou estranho,
Esbracejo, grito e da insanidade do desespero
Separo-me atrozmente do tido como rebanho,

Na lápide escrito "... de um coração apaixonado"
Fecho os olhos não duvidando dessa certeza,
Enquanto o sonho não vem estando eu ensonado

Tocarei de leve o que nomear como beleza,
Num tecto derelicto, num trilho abandonado,
Onde flor a flor darei passos com toda a delicadeza.