quarta-feira, 28 de abril de 2021

O Trazido

O oceano que trago no olhar revestido,
É folha caída numa floresta abandonada,
E os prados estelares que sinto tal vestido
São refracção para o não visto, para a luz apagada,

Passam diante de mim as opções um dia tomadas,
Os trilhos escolhidos, o claro e até o escuro,
Pois digo-vos de todas essas vontades ansiadas
Muitas das vezes fui contra um resiliente muro!

Vendo estrelas a difundir-se entre as palmas das mãos,
E eu, clandestino e viajante no interregno infinito
Sendo ponto de intersecção para melodias e seus sons

Faziam-me viajar absorto e liberto entre constelações,
Que resumia comummente num sempre e eterno grito,
Assim é que se vai e faz por chegar ao ritmo de mil corações.

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Choro as Lágrimas

Choro as lágrimas que mais ninguém vê,
Já não tenho azul para as manter a jorrar,
A dor que sinto apresento a quem me lê,
Sem um lenço que a consiga enxaguar,

Choro as lágrimas de um coração ferido, 
Atropelado pelo que é o fado, pelo destino,
Pois até quando pulsa magoa, está partido, 
É este o bater de um triste olhar clandestino, 

Choro as lágrimas onde me vou afogando, 
E todos me vêem, porém ninguém me ajuda,
Choro as lágrimas e dentro delas vou chorando

Pranteio a lástima do que trouxe na algibeira,
O velório de uma multidão numa vela desnuda,
Um mar de lágrimas arrepiando pé por uma ribeira.



domingo, 18 de abril de 2021

O Que Faz Um Poeta

Encobre-o a auréola que faz um poeta, 
Escrevendo letra a letra de noite e de dia, 
Preenchendo de belas estrofes e rima certa,
Trazendo para o real o que pode de magia, 

Este fôlego que é para a obra o seu sustento,
A inspiração é um olhar no horizonte vertido, 
Um toque, um beijo que vai e vem como o vento, 
Pois por vezes, por vezes, até o poeta está perdido, 

É uma dança lenta ao som de um fósforo a arder, 
Dentro da estrutura, é a liberdade que é do poema, 
E nele a bater vai o seu coração, todo o seu querer,

Sob palavras, sob silêncio numa voz que é universal, 
E a escreve-las não há incerteza, não há sequer dilema, 
Pois ao anoitecer ele será mensageiro entre o céu e o abismal.

terça-feira, 13 de abril de 2021

Enxaguadela

Enxagua as lágrimas, ainda vejo o comboio,
Voltarei enquanto o tempo for passageiro, 
És Vida, o fluir de memórias neste arroio, 
Saudades do que foi e não voltará, o viageiro

Leva pontos por cada sorriso deixado ao lado,
Perdido eternamente na tristeza de um coração, 
Por cada momento ou instante não contemplado
Eu tornei-me a falta, a carência e a não justificação, 

Por isso caminho perante o abismo, o despenhadeiro
É meu, se viver mil vidas pelas chuvas e torrentes,
A lama e a sujidade, sem proa e sem timoneiro,

Dar-me-ias a mão? Dir-me-ias qual a canção
Que sossega a mente e quebra as correntes,
Que repousa a verdade e trará redenção?

domingo, 11 de abril de 2021

Poema A Quem Passou, Ao Mar e ao Sol

Recolher os milhares de fragmentos de uma pessoa
É como largar lágrimas à chuva, água num riacho,
A envolvência do mar revolto, o vendaval ressoa
Fluindo pelo subsolo marítimo onde me encaixo,

As ondas e marés sustentam as margens, as miragens
Trazidas de outros lugares, a doce fonte inspiradora, 
Fatigado de tanto navegar anseio tanto novas aragens,
Há um pouco de quem passou nesta alma ensejadora,

Outras proas diriam o mesmo neste convés de calmaria,
É o vento que me abraça as velas que difunde a cantiga
Deste encanto, deste prazer, deste tormento, da hemorragia,

Embalo-me na corrente, desalgemado em noites de lua cheia,
Procuro-me onde ainda não me encontro, no espírito que mendiga,
Almejando Vida e um pouco mais de Sol onde a luz ainda escasseia.

terça-feira, 6 de abril de 2021

Um Momento de Claridade

Um momento de claridade, prontos a navegar, 
Aproxima-se o dia de reflexão, da libertação, 
A sonata para a noite, o tentar sempre chegar
À montanha mais alta, ao ponto de elevação, 

Este céu que nos abriga dos morros uivantes,
Chuva antes de mais, é uma rosa feita de amor
A partilhar que faz do longínquo menos distante
E torna este poema, mais poema, beijo, clamor!

Trago punhados de tempo no trilho e no fim
Não pretendo mais do que um pouco mais
Do que ouso sonhar ou pedir só para mim,

O rio que flui e chega defronte o mar, a maré
Vertida em sonho de porcelana, não temais
Hoje prostrar-me-ei aos pés de Oxumaré!