domingo, 24 de setembro de 2017

Àqueles Que Mendigam Amor

Transeuntes da cidade rogando por um pouco de amor
Que enquanto este não chega se engasgam consigo,
Se morreres amanhã irás com prazer, sem dor
Ou serás outra carcaça sem família ou abrigo?

És sombra na penumbra, cobrindo a face do sol,
Os restantes são pertença da vontade de partir,
Pensamentos ofegantes sob as unhas dum anzol,
Coagulados, colapsamos nos punhos de um sorrir

De um menino virado menos que um beijo mal beijado,
É mais que uma perda, é uma falta incalculável,
Os vidros partidos sob os pés de um fim retratado,

Gritos indomáveis, sou a aberração feita tentação
De traças na nuca, a doença aparentando saudável,
Quase sem semblante, quase sem sombra no chão.

terça-feira, 19 de setembro de 2017

Quando Caiu a Noite O Mundo Passou

Enfim anoiteceu e o filho do homem morreu,
Lábios saciaram-se com lágrimas de instantes,
O menino perdido foi as coisas que outrora deu,
E eu? Eu era somente o sonhador de um dantes,

Envelhecido sob rugas grisalhas, feito de fragmentos,
As pontes hoje mausoléus de um tempo sem tempo,
Choros sob estrelas cadentes, ululantes lamentos
De um coração apressado batendo em contratempo,

Sobrevivemos de água, pão e restos de regaços,
Esboços de uma partida ainda por consumar,
Pois de todos aqueles milhentos abraços

O seu foi o único que não consegui eternizar,
Assim sou a brecha a quebrar pedaço a pedaços
Vivendo dia para dia em instantes que hão-de passar.

domingo, 10 de setembro de 2017

Procurando Beleza

Lábios entreabertos com cobertores de veludo,
A mensagem do soneto prende-se com a beleza,
O simples vislumbrar desse ideal sempre mudo
É suficiente para afastar para longe a incerteza

Que é sombra e linha entre todo o luar e este sol,
Sempre itinerante passando por onde cai a vista ,
Não morrerei enquanto distante estiver o rouxinol,
Percorrerei o intervalo que entre mim e ele dista,

Procurando vestígios por dedos esticados ao vento,
Como que quase a alcançar apesar de tão distante,
És tu aquela que tem apaziguado este tormento

Emprestando-te por vezes neste meu olhar brilhante,
Assim vais passando por todo e a cada momento
Por ti Beleza habitante neste meu coração errante.

Poema Para o Passado

O passado tem ramos nas costas cravados,
É um arrastão para quem é não pertencente
Ao momento presente, aos instantes alados,
É nos restos que se ergue tal quarto crescente,

Por vezes paro para vislumbrar o caminho,
Penso no alcançado e no outrora já perdido,
Quão lotado tem estado apesar de sozinho,
Será que o que passou foi realmente vivido?

Desconfio dele, pois tudo é tão e tão imanente,
Tal sonho imaginado dissipando-se pelo trilho,
O esvaecer do ecoado é sombra no homem ausente,

Porém desse passado sou ainda o eterno filho,
O último saudosista de olhos postos bem em frente,
Enquanto não passa o futuro neste beijo que partilho.

O Marinheiro do Infinito

Vai assim nocturno o infindo no passageiro,
Dorme na proa sem qualquer tino o navegante,
Vem a habitação, quase lar, de outro timoneiro,
Vai e vem a onda sempre a empurrar o instante,

As luzes são ciganas e dadas a voláteis paisagens,
O corpo âncora para o eterno, vela para o infinito,
Subindo o oceano, sou eu para sempre entre margens,
O mastro deste peito nada mais que indomável grito,

Pois eterna é a essência denominada como presença,
É convés e porão dependendo do beijo do sonhador,
Por isso irmãos, deixemo-nos desta enorme descrença

Que nos habita o coração e nos abraça em desamor,
Sobreviver-lhe é nesta Vida a grande recompensa,
Encontrar porto de abrigo e entre a calçada uma flor.

Ela e Ele

Ela vestia vestidos feitos de brisa passageira,
Cerúleos por vezes, outras com todas as cores
Longos a cobriam até às suas sandálias de areia,
Assim a cobiçavam por inteiro seus mil e um amores,

Para ele todas as moças eram donzelas apaixonadas,
Rodopiando seu vestido feito com toda a sua ânsia,
Era o cupido jocoso com as suas setas quebradas
Que não conseguia ultrapassar toda a distância

Que devorava corações apressados em seu bater,
Ele era ridículo e coitado a cada vislumbrar dela,
Por vezes até a ele só lhe apetecia enfim morrer

Pois ela era última fonte de luz, a única estrela,
De um momento que era impossível de reter
Pois pertencia à brisa daquela tida como bela.

Àqueles Que Trago No Peito

Por brechas e fendas vai indo assim esta vida,
Sou fragmento daquilo que tenho sobrevoado,
Onde Mãe é palavra de ontem, quase esquecida,
E eu sou mendigo e pedinte quase quebrado,

Porém da morte vem o inteiro e o seu adjacente,
Beijo as mãos daqueles que as têm partilhado,
Sou resto do mundo em solavanco ascendente,
E sou porto de abrigo para quem se tem abrigado,

Sorri nestes lábios e chama-me pelo nome de Deus,
Ele sou eu, eu sou ele e em mim tenho-vos a vós
Assim é no eterno a partida sem um tom de adeus,

E assim por um momento sou único, ouço a sua voz,
Indizível, inaudível, inaudita em mil e um apogeus
Deixai-me partir e talvez nunca ser chegada a uma foz.

Aos Momentos Partilhados Vindoiros

Cicatrizes e enfeites na pele tal decoração,
Instantes passados acumulando neste vento,
Por cada passo dado rememoro esta oração
Que me confere leveza e um pouco de alento,

Uma coroa de espinhos ou um diadema de luz,
Serei um, sempre e nunca passando pela metade,
Apenas assim o que trago no ventre sobreluz,
Apenas assim vejo enfim vislumbres de beldade,

Pois haja tristeza e penumbra e o sono profundo,
Beijá-los-ei a eles, repletos de amor para partilhar
Num lamento lúgubre pela velocidade do mundo,

Irei entre brechas por onde nunca consegui entrar
E lavar-me-ei bem até estar bem sujo e imundo,
Por momentos partilhados por tanto ainda ansiar.


segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Chega de Amar

Duas almas são no trilho da encruzilhada,
Porém hoje não escreverei mais sobre amor,
Chega de clichês, de escritos sobre nada,
Sobre estrelas cadentes ou o beijo da flor,

Não mais a promessas ou à lágrima do amador,
A noites e tardes passadas de mão em mão,
Ao olhar entre olhares recitando a sua cor
E a suspiros arremessados ante o coração,

Chega da partilha de sorrisos, ideais e compassos,
Do terno leito, do ósculo no peito, do até já,
Esquecer o caminho e os seus mil passos

Chega de imaginação do doentio sonhador,
De borboletas no estômago e o que de mais há,
Chega de valsas ao pé-coxinho e da palavra amor.