quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Pois Um Dia

Fechando os olhos apenas por um momento,
A berma afastada celebra um sonho sonhado, 
Recuso-me a partir, a esquecer o sentimento
De quem se largou no poema, o escrevinhado, 

Não posso descurar que somos poeira ao vento,
O anseio e desejo futuro, um instante passado,
Pois ao partir a pegada na estrada é testamento
De quem lá passou em ritmo lento ou apressado, 

Para a foz tragam o melhor que vem da passagem,
Esta brisa é o ponto do tempo que é toda a verdade,
Por isso preencho os pulmões, sinto-os com a aragem, 

A procura é por quem não encontramos, dentro ou fora, 
Almejando que o dia regresse agindo em reciprocidade,
Pois um dia sim iremos todos fugir, iremos todos embora.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

O Passo Desalinhado

Esta melancolia verte-se na lágrima caída,
Esta solidão, esta demora é esta amante,
Por quem me enleva o coração, a batida
Aumenta o ritmo da chuva sempre errante, 

Espero por quem ainda não me apareceu, 
Espero por quem já foi e partiu há estações,
Esquecendo o beijo que esvoaçou para o céu
E timidamente, esqueceu a fluidez das canções

Que adormeciam gigantes na delicadeza do amor,
Então merecem os corações esse toque de Ícaro? 
O perdão pedido, as asas ardendo e neste torpor 

Encontrar felicidade, o morrer com um sorriso traçado,
Que o morro deixe a paz e paixão elevada ao pícaro
Do Elísio, pois tem de haver trilho para o passo desalinhado.

Acredita Nestas Palavras E Confere-me A Mão

Confere-me a mão em plena confidencialidade,
Demonstrando-me que não há razão ou idade
Para se ser feliz por um momento desta vida
Pois a qualquer instante vem o fim, a partida, 

Logo devemos aproveitar este bocadinho de sol, 
Escapar às curvas da estrada, às redes, ao anzol,
Pois há tanto para ver e saborear, há tanto a tocar, 
Por vezes parecemos baratas tontas de papo para o ar, 

E há parte do expoente do dia, parte do que é importante, 
Por isso a procuro sempre mais e mais, o eterno suplante
Do passado, o amor indomável, o beijo eterno e devasso

Em breve seremos novamente poeira, é erro crasso
Não aproveitar este mundo enquanto nele estamos,
Ou não instanciar o beijo enquanto nele habitamos.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

De Mão em Mão

Cabeça na almofada, despertador na cabeceira,
Debaixo do Sol caminhamos de mão em mão,
Perdidos entre cores, encontrados na ribanceira,
De tanta curva e contracurva, vem a contramão,

Lá fora o Luar expedita aqueles sonhos e ilusões, 
Onde, de mão em mão, estrelas foram alcançadas, 
Nas frentes outrora escuras temos nossas dimensões,
Este instante é nosso, dizem as noites alvoraçadas,

E se um dia me faltar o ar, se um dia eu for partida, 
Que o deslumbre continue, que não seja peça extinta,
Pois enquanto formos de mão em mão, na investida,

E tivermos falta de mais, chama, o mundo a nossos pés,
Trincando a maçã, bebendo o vinho na sombra indistinta, 
Com saudades do Lar, lugar, beijo na face em belos rodapés.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Eu Por Cada Momento

Transpõe-me para uma ausência de escuridão,
Pois a terra é um carvalho assente em raízes, 
É um livro escrito com galhos em imensidão, 
Apontado para Norte, somos meros aprendizes, 

Folhas caídas pelo Outono revestidas, doce som,
Pois aqueles que abdicam de si são crianças nuas, 
Calcando ignorantes o futuro e a sua sofreguidão, 
Assim vão passando os sois, assim passam as luas, 

Daqui para o infinito e dele para o preciso instante
Onde enveredamos pelo trilho cuja semente é plantada, 
Crescem fortes estes troncos do peito, não obstante

O quanto nos lembramos do que pretendemos projectar,
Este jardim de Éden, os campos Elísios, a luz fragmentada
Nada nem ninguém me irá impedir de cada momento amar.



A Candeia Para a Escuridão

A exigência de pedágios para a passagem na ponte,
Caminhando ouço as vozes dos que me precederam 
Eu, só o viandante pretendendo chegar ao horizonte
Trazendo aos ombros os gigantes que antes viveram, 

Entre montanhas e vales, que me siga quem se procura, 
Este trilho é abóboda celeste para os reais sonhadores
E será caminho da brilhante escadaria à viela escura
Pois somente a revinda do sonho removerá as dores

De quem amou e ficou demasiado tempo perto do fogo, 
Inalando fumo nos pulmões por longínquas distâncias,
Saibam que um dia chegaremos algures... logo, logo

Seremos a pertença de um beijo doirado jamais dado, 
Anjos entre homens, homens inteiros e até crianças,
Este coração é candeia para a escuridão, é o fado. 

domingo, 7 de fevereiro de 2021

O Universo de Si Consciente

Quando viramos a coberta que nos encobre,
Há horas passadas que vão pelo nevoeiro
Do tempo, nossa riqueza que nos faz pobre
Se enquanto não usado vai com o barqueiro,

Tais passos não dados, a indiferença do olhar, 
É assunção de escassez de vida, de partida
Do ser antes de ter ido, não é possível amar
Sem deslumbre se a margem não é querida, 

Fugimos à morte se atingirmos o acontecimento,
Deus pretende que entrelacemos nossa história,
Somos expoente em vida se formos no momento, 

Portanto assim vou e rumo desaforado e impaciente, 
Um dia sim, seremos apenas mais uma memória
Porém hoje somos o Universo de si consciente.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

É Preciso Despertar

É preciso despertar o brilhante do firmamento, 
Transparecer luzidio para poder alumiar o dia,
Este aqui é o único instante, o único momento
Para poder trazer o brilho das estrelas e a magia, 

Escrevo-a dentre dedos cujas pontas são esticadas
Para o horizonte longínquo, porém, no presente, 
É assim que nascem asas destas costas arcadas
Mesmo quando regressa a chuva incipiente,

Lembranças dormentes passando de mão em mão
E não tidas tais nuvens brancas além escondidas
Até andei de pernas para o ar para sentir o chão

Entardecendo a aurora com um Luar versejado,
É preciso reencontrar as horas outrora perdidas
Para finalmente reencontrar o nosso Sol amado. 


quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

O Abismo Entre Eu e Ela

Estas quatro paredes nunca nos segurarão,
Não enquanto houver novos sítios e lugares,
O movimento é o que digna, enleva e dá a lição
Do tempo partilhado e os seus diferentes estares,

São caminho no holofote, para termos de novo vida.
O mundo entretanto mudou, é difícil ir de mão em mão, 
Pulsa o peito batente é tumultuoso e anseia por guarida
Que gostaria que fizesse parte do cenário, da conclusão

Em que dois eram somatório, oratório para os deuses do olimpo, 
Rodinhas para rodar, asas para voar e olhos para conseguir ver,
Saudades de casa, o seu ombro arrebatado a um cerúleo tão limpo,

Não obstante, verto-me por degraus para chegar a esse lugar, 
Algemado ao coração, tentando não sentir o óbvio e o tecer
Que me entrelaça a ela é abismo para o não saber quando amar.


terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Quando Vier a Emboscada

Há quem passe a vida perseguindo-a sem nunca a alcançar, 
Numa doce procura, numa caminhada através de labirintos,
Através do escuro beco sussurram as vozes num abismar
Que parece de outra dimensão, de tempos outrora extintos, 

Prosseguindo as inquietudes da alma trazidas na algibeira aberta,
Os sonhos verteram-se para o chão, perdeu-se a razão para amar,
Ninguém pisca os olhos, quanto mais fechar, a quimera é incerta
E nessa mesma incerteza que era dela não permitia ser ou estar,

Porém há uma esperança que ainda perdura no canto do olho, 
É a brasa, o estado de afogueamento ou rubor vivo vivido,
Procurando os luares adormentados na meia-luz do sobrolho, 

Reflectindo a luz e a sombra da estirada, a mais bela emboscada
É o não saber quando espreita a cilada no passo já oferecido
Ao chão, venha o dia, seja a noite e que a luz jamais seja ofuscada.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

Guerra Civil

É a algazarra no vértice da esquina, ruído e barulho, 
De antemão já sabia que vinha para o fim do mundo, 
"Guerra é guerra!", bramo e com o punho erguido vasculho
O inimigo removeu-nos das nuvens para um poço profundo, 

Dormitamos entre o fogo e é então que irmão mata irmão,
Sem fraternidade, dou a outra face, rogo aos santos e a Deus
Pois é nesta altura que até o ateu vira crente tal é a confusão,
É também nesta altura que o familiar se vira contra os seus,

A Morte a pairar por perto não distinguindo velho de criança,
O saque, a pilhagem, o furto é a indistinção entre a diferença
Vai-se a crença, fica a ilusão e miragem, preso sob fiança,

Estas cruzes, estes sepulcros sem nome, são de irmãos
Que cavaram sua cova sozinhos, essa é a sua sentença
Perante o pai indiferente que do negrume lava as mãos.


 

quinta-feira, 21 de janeiro de 2021

Vamos Deixando Poeira de Ouro

Outrora era um homem no epicentro da confusão, 
Esvoaçando cego pela luz, ouvindo os sonhadores
Não mais do que um vislumbre para fora desta ilusão,
Debaixo do holofote a peça acabou sendo eu os bastidores, 

O passado por vezes apanha-nos e prende-nos à sua beira, 
Procedemos a busca pela fragrância que faz mais sentido, 
Entretanto balança, balança e caem-nos sonhos da algibeira
Será esta a viagem para a qual não nos teremos ainda precavido?

Lanço os braços adiante e alcanço parte custódia do firmamento, 
Sabes que houve alturas em que a geada preencheu este coração, 
As nuvens que me passam, os beijos que traçam este momento,

Por isso inspiro o suspiro que vai e vem, eu sou aquilo que é deixado, 
A poeira de ouro bem sedimentada é trilho inverso por vocação,
O resto que ainda está para vir é o resto que falta ser abraçado.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Estas Velhas Algemas

As salas vazias e as escadas para a cúpula apontadas, 
Vamos vivendo para o dia a dia, daqui tão longínquo, 
É o motim que me traz à tona, as setas quebradas,
A prisão do próprio pensamento caindo obliquo, 

As palavras lajes para um discurso inacabado, 
No peito sinto-vos, a mesma criança sonhando,
Durmo com os olhos abertos, ainda perturbado
Dentro da raiz esquecida, a mim me arrancando,  

É o fardo de quem partiu, porém não é a chegada
A inteireza que ansio é maior do que estes poemas,
Procuro mais do que onda ou matéria, a porta fechada

Que abrirei com ou sem chave, é o poeta e os diademas
Alçado a brisa branda sobre a margem e a sua fachada,
Um dia vos prometo, um dia partirei estas velhas algemas!

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Poema De Um Homem Sob O Oceano

De pés descalços sobre a raiz do azul oceano,
Paciente e resiliente face às ondas ainda por vir,
Voamos vestidos de reflexos cerúleos sem engano,
Este é o sítio neste momento para por fim as sentir,

Por isso nos importunam as nuvens na veloz ascensão, 
Sobre a água uma ponte invisível, que doce beleza,
E por aí não obstante bate por fim o uno coração
Rematando para longe os traços de dor e tristeza, 

Encurralado entre os antebraços, deposito os abraços
De quem me pretende próximo, um rosto no beijo
E vem o desejo, e vem a vontade a nítidos laços,

O ar engolido, libertado em busca de um tesouro
Maior do que a vida, maior que o maior almejo,
Aqui é onde fico e me preparo para o tempo vindouro.




quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

As Horas Sedentas

Então sozinho fui andando numa linha estreita,
Perseguindo as sombras tortas desta parede, 
A candeia luzidia pela rua que se endireita
Acima da colina e eu escapando sem rede, 

Logo rasgava esquinas acossando a fragrância,
O seu nome ainda apaziguando as lides nocturnas, 
E eu correndo em tamanho estado de beligerância
Via-me ao longe parado através de dias e horas soturnas, 

Entretanto o rosto enrugava assentando no fundo
De papeis amarrotados onde rangendo os dentes
Era voz formada de vazio em tom nauseabundo,

E sonhos quebrados isolados por paredes cinzentas,
Por vezes custa-me continuar a luta por quatro frentes,
Porém continuar é preciso para preencher as horas sedentas.

sábado, 2 de janeiro de 2021

O Análogo do Viver

Eternizado num momento, a eterna adversidade,
De lápis em riste, feliz ou triste, irei escrever
Sobre voos e quedas, o humano e a divindade, 
Acordar o Pégaso e dar a vida ou até morrer, 

Da rota e o seu peregrino ao universo e a viagem, 
Há liberdade na falésia e há paixão no esvoaçar,
O deslumbrante é cativo do sem pertença, a aragem
No rosto e pés descalços no verdejante, sim, o amar

Quem aparece no espelho, a colheita do plantado
É amor redobrado, é preciso ar para poder revir
E as folhas caídas da estrada são bosque encantado 

Para quem não deixou de acreditar, havemos de ir
Perto ou longe, alto ou baixo, desde que andemos,
Pois o análogo do Viver diz o quanto viver queremos!

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Enquanto Houver Vida

Então tropeçava nas estrelas cadentes do caminho,
Assim, impaciente para ir e ansioso por chegar,
Com candeias rodopiando a cabeça, oh carinho
Partilhei segredos que desconhecia, vou devagar

Subindo a colina, tentando não olhar para trás, 
O céu desmorona e a terra treme, é o motim
Que só é dos poetas, é preciso correr atrás
Do beijo, do abraço, do saber dizer que sim, 

Quebrar o feitiço do mundano, isto é a vontade
De ir sem esperar por empurrão ou travão, 
Um dia chegaremos e esse dia será metade,

Perfeitamente complementar, de mão em mão, 
Esperando a Lua para poder dançar em reciprocidade,
E em boa verdade, conseguir trazer Vida para o coração

(pois só isso é verdade...).

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

Arrependimento

De quando não fui pelo instante passageiro,
Por isto ou por aquilo não me preenchi de Vida,
Por tanta cautela, fugi a medo sempre ligeiro,
No meio da luz fui escuridão sem qualquer lida, 

Quando podia andar arrastei-me por entre corredores, 
Estas linhas de vida e sinais de quem foi esmorecendo,
Isto é quando andar na água não faz de nós salvadores,
Quando não há distinção se vamos subindo ou descendo,

Há um velho que fui, a mais leve queda, os lençóis engelhados,
Não há livro onde caibam as possibilidades do que não foi, 
Por isso os enterro em tecidos funerários embrulhados,

Percorrendo as palavras afirmativas e negativas, o caminho, 
Pois as hóstias que engulo não sanam a ferida que ainda dói
E o beijo para onde rumo, longínquo, aqui procuro-o sozinho.

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Pedágio da Vida

Sou uma retícula à porta de uma encruzilhada,
Honrando a voz que é bramido pela ribanceira
Levando-me adiante onde vou pela algibeira,
Ora veículo para a berma, ora simples estrada,

De instantes sendo retido, conforme prometido
Sou apenas uma alma vagabunda indo em frente,
Encontro e perco-me  face ao tempo que indiferente
Me julga mediante as rugas no rosto em si reflectido,

Vai ficando a voz grisalha, os beijos então glosados, 
Entre duas margens, entre as bermas, o terno cinzeiro, 
Sendo pertença para quem não vê, onde os implicados

Fecham-se em quartos sem janelas, é impossível ver
A cor do prado, a luz do sol, sem recado e do bueiro,
Metade ou inteiro, quão difícil é por vezes simplesmente viver.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

Até Que Durma

Hoje a morte levanta-se, portanto, disparem à vontade!
Pois apesar do amor por ela, ele continua seu escape,
Não obstante do sentir e da congruência da metade,
Fugindo sem aviso, como os outros, eu outro recape

Na ferida fugindo do dilúvio, da sombra obscura
Que é fraterna da morte, amor no chão quebrado,
Que é queda na cova, que é viela da rua escura,
E isto vai passando, vai-se esquecendo o bocado

Em que éramos o único toque e o lábio descarnado,
A vida de poeta não é fácil pois escasseia o deserto
Para a sede, e a sede é de infinito, o rasto entornado

No trilho da combustão instantânea, dá vontade de (r)ir, 
Hoje então descanso com moedas nos olhos, o incerto
Apadrinhar-me-á até meu cansaço vier e se esvair.
 

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Se Soubéssemos

Se soubéssemos beijar não haveria solidão
E acordaríamos repletos de maquilhagem
Enquanto parte de nós apertaria o coração,
Outra parte iria com o vento, com a aragem, 

Se soubéssemos nadar não haveria mais naufrágios, 
Pois sem problemas nadaríamos de costa em costa,
São estes suspiros que afugentam os maus presságios
Onde o pôr-do-sol em si vai e no horizonte se encosta,

Às paredes de uma glória pertencente a  uma outrora, 
Penso em todos os afogados, aos quase interrompidos,
E assim vem quem deve vir no passar desta ligeira hora,

Pois havemos ficado cansados de ser barulho de fundo,
Da ténue linha que separa os olhos no céu insculpidos
Da areia molhada ao ver incipiente que vê o mundo.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Os Filhos de Ícaro Pt. II

Há degraus a subir sem olhar para trás, 
Tal Orfeu e a sua busca que a luz ofusca
E passos por conferir em busca de paz
Enquanto se rebusca o quanto a alma custa,

O sol e o seu corrimão que abrasa o coração,
Quantas vezes estas escadas foram mascadas,
Quantas vezes sua inauguração passou de mão
E as estrelas ficaram ancoradas em emboscadas?

Pois aqui quase detenho o luar evidente hoje neste olhar, 
Aquele para o qual é preciso coragem para ir na viagem,
Nem há esforço a andar, é somente preciso ir para alcançar!

É preciso acreditar para voar, ter noção das asas e seu propagar,
Agora é onde escolho tirar a maquilhagem e ir com a aragem
Sem ser preciso os sonhos penhorar, é preciso é ir e concretizar.

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Os Filhos de Ícaro

Abrindo a cortina do sorriso, o quão é preciso
Estar presente com brechas na parede, ter sede
De algo maior e superior e nós em improviso,
É a dança da Vida, o truque é não cair na rede, 

Corpos cansados não podem descansar, então adiante!
Deixem a luz entrar, persianas com as fendas abertas, 
Preenchem o peito e facultam o poder do instante
Na voz de mil gerações ao passar das horas incertas,

As sentenças tornam-se convalescenças de um outrora, 
Mal recordo os rostos que passaram, só o que ficaram,
Caminhamos o trilho para o Sol, rumo à boreal aurora

Se cairmos enfim encontra-se outra solução do problema,
Sozinho ou a dois, quantos por cá passaram e ansiaram 
De olhar fechado beijar o horizonte? Assim nasce o poema.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Amar Para os Poetas

Amar não é para os poetas e só os poetas sabem amar,
É o suspiro ante o precipício e conseguinte mergulho, 
Não há que disfarçar, são poucos os que sabem beijar,
Sem se esconder, são poucos os que aguentam o marulho, 

Amar é para os poetas pois só os poetas não sabem amar, 
É a brasa na lágrima que os diferencia da comum gente,
Pois há da brasa cinza e da lágrima sulfato, o germinar,
O caminhar, diligente, vai de lado para lado, para a frente, 

E há quem não aguente, e há quem o faça numa eterna dança, 
Quem vá magoado a chorar para casa com o coração na mão, 
E quem o partilha de mão em mão em constante perseverança

Não obstante do quanto andou ou já passou, ao mundo dão,
Amar é e não é para os poetas, pois só eles sabem seu teor
Do sentimento em papel ao toque do sorriso e da sua dor.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Entrelaçado Com Aquela Que Me Importa

Os seus beijos ofegantes, delirantes aqui centrados, 
Parecem balões de algodão no céu alto esvoaçando,
O calor da sua mão relembra-me aqueles bocados
Nos quais não olhávamos para trás, íamos ansiando

Reciprocamente o carinho que entre nós então havia, 
O quanto ela me queria, o quanto eu a queria, e cria
Nessa crença sem pertença que levanta as fundações
Do céu, o seu corpo no meu entrelaçado - as escoriações 

Sediadas no peito e alma, porém com calma vivíamos, 
Pintando as constelações, um ao outro pertencíamos, 
Éramos mais do que recordações, éramos o infinito

Um dentro do outro a refractar num olhar tão e tão bonito, 
Afagado no interior de um abraço maior, cheio de beleza,
Que em meados desta melancolia me conferia asas em subtileza.

Entre As Insónias e o Sonhar

As insónias estão associadas à impossibilidade de sonhar,
Respiro o murmúrio abandonado por quem um dia passou,
O segundo passageiro, o terno forasteiro a si a se flanquear,
É o momento feito instante para sempre reiterante que voou

Para a planície distante onde reinam seres divinos e imortais,
Respiro o suspiro deixado ao percurso, o piscar da vista e olhar,
Um brinde de copo cheio aqueles seres loucos e imorais, os tais
Que saltam cercas e desmoronam muros, consenti ao pedinte amar

Pois traz cores ao mundo, é um alívio profundo maior que o viver,
O retrato apesar de inexacto de um propagar de asas do passarinho,
Sabendo que o lugar onde criou seu ninho também lhe fez crescer

Cores várias no assentar do segundo, o beijo de uma temporada,
Não obstante se estes passos vão então depressa ou devagarinho,
Desde que o caminho leve ao fim da noite, ao chegar da alvorada.

segunda-feira, 30 de novembro de 2020

O Velar Nesta Condolência

Estas lágrimas que escorrem pela face acorrentada
Ao passado, há tanto deixamos o lar e ele esquecido
Trouxe o coração infracto, a sombra que é da estrada,
Da curva à berma até à margem e eu então enternecido

Pois os sóis distantes eram vertidos por horas transientes,
Eu insignificante, porém importante, maior que o mundo,
Repleto de luz para partilhar de vista na chuva incipiente,
E assim de repente, sem vestígios de graça então me afundo

Em trajectórias cúmplices com joelhos e pernas quebradas,
Longínquo sonho, tanto a andar com esta sede de infinito
Coincidente com beijos não dados e de mãos afastadas, 

Sonhando sem respirar, preciso de ti amor, és a carência, 
A falta, a privação e escassez que acolho no interno grito
Que zela a alma dos perdidos, que velo nesta condolência.

terça-feira, 24 de novembro de 2020

Estas Palavras Escritas

Recontam-me o silêncio de uma madrugada escurentada, 
Inebriado por versos de um poema hoje desconhecido, 
Deixado algures numa rua atrás da porta escancarada, 
Onde era tudo e nada num escrever por Deus enaltecido,

Escrevi de ti para mim, estrofes pomposas repletas de beleza, 
Pois o silêncio desses lábios era demasiado para aguentar,
Então no papel os coloquei para esconder essa subtileza 
De um rosto trazido no coração que não pára de tentar, 

Esta lágrima luzidia neste olhar nublado e o ecoar da solidão
Pelos corredores de mármore a passo pesado, quase a chegar
Ao lugar onde permaneço, donde escrevo poemas de imensidão

Pela tua voz em sonetos, esse toque em papel, maior do que a vida!
Não tem fim este amor quebrado, é enterra-lo para não me acorrentar,
E enfim, livre para voar para longe dessa tristeza, por uma capa envolvida.

Por Cada Momento

Outro poema que veio e já se foi assim esvaecendo
Na reflexão nos corredores destes tempos passados,
Ao fugirmos da chuva, cantarolando e revivendo,
Atravessando vistas e olhares por ontem defasados,

Reunindo-se onde ainda havia a criança e a esperança,
Sem canseira do vulto que quer ser homem ou mulher,  
É este coração vagabundo que por ter tanta lembrança
Vai por vezes morrendo por tudo não conseguir conter, 

E esta nostalgia amálgama com saudade, é o sorriso
Vertido na lágrima do órfão sem amante, o restante,
A estação que passa, de oásis nos desertos preciso

O rosto lunar no avarandado do sol, e eu rouco de bramar
O pé descalço na valsa do pé-coxinho, a poesia do instante
É esta paixão aqui, hoje, agora e em cada momento por cada amar.

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

A Eterna Procura E Espera

Procurando abrigo desta precipitação interior,
O desejo é simples, é um dia outrora fustigado
Por sorrisos onde abrolham flores longe e em redor
Do coração, que venha a estação, direi o recado

Deixado à porta dos deuses dos vivos e dos mortos,
E esta mensagem escrita a ferro e fogo nas paredes,
Pais, filhos e avós lembrados e nós imóveis e absortos
Pois sabíamos que esta água não saciaria estas sedes, 

De homens indolentes cujo trilho não deixa encalço,
Este rastilho até mim, este olhar até o fim do horizonte
Onde o acontecer é real, não há hesitação ou percalço,

O fôlego deste amanhecer, procuro da chuva resguardo,
Entre os charcos um reflexo livre de ruídos, claro e insonte,
Dentro da ondulação as palavras: “Eu por mim aguardo!”.